Poesia – Corsino Fortes
Pecado Original
Passo pelos dias
E deixo-os negros
Mais negros
Do que a noute brumosa.
Olho para as coisas
E torno-as velhas
Tão velhas
A cair de carunchos.
Só charcos imundos
Atestam no solo
As pegadas do meu pisar
E fica sempre rubro vermelho
Todo o rio por onde me lavo.
E não poder fugir
Não poder fugir nunca
A este destino
De dinamitar rochas
Dentro do peito…
Corsino Fortes
Corsino Fortes
Considerado “o maior poeta épico cabo-verdiano”, nasceu no Mindelo, região de São Vicente, em Cabo Verde, a 14 de Fevereiro de 1933. Estudou Direito na Universidade de Lisboa e, posteriormente, trabalhou como professor e juiz do Tribunal de Trabalho. Após a independência de Cabo Verde, desempenhou o cargo de embaixador do seu país em vários países europeus e africanos. Fortes também foi ministro da Justiça e magistrado.
A linguagem usada na construção do poema é desde logo testemunho da originalidade do poeta no domínio da literatura cabo-verdiana. Foi o primeiro a fazer a fusão entre o português, língua oficial do território, e o crioulo, particularmente o usado na sua ilha natal. Fusão que é característica, não só da literatura, mas do próprio devir da cultura caboverdiana, profundamente marcada pela mestiçagem e pela emigração.
Faleceu em 24 de Julho de 2015 vítima de doença prolongada.
Esta rubrica pretende dar a conhecer ao mundo o melhor da poesia por diversos autores lusófonos. Os poemas são selecionados por Gilda Pereira, uma fã incondicional de poesia.