Desafios da sucessão empresarial internacional

A sucessão geracional nas empresas (familiares) é um momento decisivo para a vida das mesmas; do sucesso da sua realização, de forma eficiente e tentativamente conciliadora dos interesses em causa, depende a sua boa saúde.
Estando presentes interesses potencialmente conflituantes – os empresariais e os familiares –, que podem bloquear a vida empresarial, devem ser criadas regras precisas para a gestão da empresa e para a sua interação com a família.
Adensa a complexidade elementos internacionais da vida empresarial, da vida familiar ou de ambas, que tragam à colação diversidades culturais bem como legislações e jurisdições.
Assim, é premente a elaboração de protocolos familiares nestas empresas, i.e., acordos dos familiares (incluindo ou não os cônjuges e as gerações mais novas), contemplando os princípios da empresa familiar, criando órgãos (como o Conselho de Família) e regras disciplinadoras do funcionamento do tecido empresarial, por si e com a família. Podem ser previstos requisitos para a atribuição de funções, direitos e obrigações aos intervenientes, sanções para incumprimentos, regras para a escolha dos sucessores, planos para as gerações advindas, eventuais compromissos de representação empresarial de todos os ramos e gerações, indicações de regimes de bens e convenções antenupciais a adotar pelos familiares, sugestões quanto à outorga de testamentos individuais, formas de resolução de conflitos, escolha de lei e tribunais aplicáveis a eventuais dissidências (especialmente relevantes quando há elementos de conexão com outros países).
Paralelamente, deve ser feito o planeamento sucessório de cada um dos membros da família empresarial, sendo especialmente relevante para aqueles que residam noutros países ou tenham mais do que uma nacionalidade.

A outorga de testamento poderá, por exemplo, assegurar o cumprimento das regras estabelecidas num Protocolo Familiar, com a possibilidade de introdução ou não do cônjuge sobrevivo não familiar na empresa. Para o efeito, dever-se-á atender cuidadosamente às regras sucessórias aplicáveis, que, consoante a residência ou nacionalidade do testador, poderão divergir das portuguesas.
Tratando-se de uma sucessão internacional, ou seja, com conexão a vários ordenamentos jurídicos, Portugal aplicará as regras do Regulamento (UE) n.º 650/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, vinculativo para a quase totalidade dos Estados-Membros, nos termos do qual a regra é a aplicação da lei do país da residência habitual do falecido, somente assim não sendo se o testador tiver escolhido, por testamento, a lei da sua nacionalidade ou se tiver uma relação manifestamente mais estreita com um Estado diferente.
Pode haver conflitos entre jurisdições e leis aplicáveis – imagine-se que falece, na família, um cidadão brasileiro, residente habitualmente em Portugal, sem testamento; os órgãos portugueses consideram-se competentes para regular a sucessão; todavia, o Brasil aplica o critério da nacionalidade, considerando-se também competente. Logo, se alguns herdeiros entenderem que a lei brasileira lhes é mais favorável, podem recorrer a tais instâncias. Tal pode ter implicações substancialmente distintas na esfera da empresa familiar.
Para evitar similares situações, o planeamento sucessório individual e empresarial internacional deve ser realizado de forma rigorosa, atendendo aos vários direitos potencialmente aplicáveis e aos interesses dos potenciais beneficiários.

Marta Costa, Abreu Advogados.

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