E.P.E. para as nossas Comunidades

No 30 de novembro passado o movimento “Português para todos!” apresentou suas propostas ao Plenário da Assembleia da República. O conjunto de propostas expostas enquadra-se nos objetivos plasmados no Plano de Ação do CCP, nomeadamente no eixo temático “Língua e cultura para a identidade:
(…) “Deve-se distinguir as políticas de língua, ensino, cultura num contexto de internacionalização da língua portuguesa, a sua grande afirmação enquanto língua global, e as políticas de língua, ensino, cultura e identidade para as comunidades. Assim, propõe-se definir uma política de língua que promova a preservação e conservação da língua materna dos lusodescendentes e não uma política linguística direcionada para a mudança de língua logo na segunda geração; definir uma nova política de língua onde se inclua o Português Língua Materna (PLM) para as crianças e jovens portugueses não residentes em Portugal (…)”.
Contudo, são de extrema gravidade os argumentos inconsistentes e falsos sobre as realidades do Ensino de Português no Estrangeiro (EPE) nas Comunidades eivados de racismo linguístico, apresentados no Projeto de Resolução do Partido Socialista e destacados na intervenção de um seu deputado em representação do Grupo Parlamentar. Consideramos que o Projeto de Resolução do PS, sem qualquer evidência sustentada em bases científicas, releva inconsistentes argumentos sobre o EPE:
a) “que os argumentos utilizados pelos peticionários e outras iniciativas legislativas de outros grupos parlamentares não colam com a realidade das nossas comunidades” b) “que o EPE está à beira da extinção não corresponde de forma alguma à verdade nem beneficia a imagem da Língua portuguesa” c) “Consideramos errado que se atribua à mudança de tutela para os Negócios Estrangeiros e ao novo regime jurídico do EPE, de 2006, os supostos problemas do ensino. Não é assim. Houve de facto uma mudança de paradigma, mas num sentido que nos deve orgulhar, porque a Língua portuguesa começou a deixar de ser vista como uma língua de emigração para ocupar o lugar que merece por direito próprio, a quarta mais falada no mundo (…) e presente na rede em 17 países; d) “A mudança de tutela e o novo regime jurídico trouxeram mais ambição e rigor ao EPE ( …) e a maior capacidade de resposta às realidades e necessidades no terreno. A adoção do Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas elaborado pelo Conselho da Europa, não veio estrangeirar os jovens portugueses nem anular o ensino em Língua materna, mas sim trazer mais qualidade pedagógica e reforçar a importância na certificação dos cursos enquanto instrumento fundamental de valorização dos percursos académicos e profissionais;” e) “O pior mesmo é quase a xenofobia sem sentido que refere que os cursos de são dirigidos a estrangeiros e que os portugueses são discriminados, só porque houve uma redução de número de alunos nos cursos paralelos no período da Troika. Não é apenas falso, como a língua portuguesa não deve ficar presa no gueto da Língua materna, o que seria uma forma de, aí sim, criar dificuldades à formação dos cursos por escassez de alunos e afastá-la da realidade concreta das nossas comunidades, onde os níveis de desempenho linguístico variam enormemente em função do contexto familiar e que os professores sabem muito bem gerir na sala de aula” (…).
Face ao exposto, e no que concerne os enunciados falsos e inconsistentes argumentos do Projeto de Resolução do PS ocorre-nos relevar os seguintes: 1) Continua a ser manifesta a incapacidade do PS, e dos Governos por si liderados, em saber distinguir as políticas orientadas para a Estratégia Global para a Internacionalização da Língua portuguesa, das políticas dirigidas às crianças e jovens luso-descendentes no quadro da rede do EPE, em contexto diaspórico. Estamos perante estratégias com objetivos diferenciados, e no qual se têm tomado opções lesivas dos direitos linguísticos, culturais e identitários dos lusodescendentes à luz do articulado constitucional.

A estas crianças e jovens foram subtraídos o direito constitucional à preservação da sua língua materna na sua matriz identitária, e abandonados à total assimilação linguística e cultural nos países onde residem. Com efeito é profundamente triste ver o PS esgrimir as mesmas designações patenteadoras de um racismo linguístico como as de Língua de emigração e, de Língua não presa ao gueto da língua materna. Aqui o PS cola-se aos mesmos objetivos hoje, e quase sempre perseguidos, pelos países de acolhimento ao negarem o direito à aprendizagem formal dos lusodecendentes da sua língua materna nos seus respetivos sistemas educativos. O PS e o Governo não devem na sua ação política confundir assimilação cultural com integração culturalmente diferenciada, e deixar de colaborar com os países de acolhimento como tem feito até ao presente, na assimilação linguística e cultural dos lusodescendentes.
2) O PS declara, de forma categórica, ser o único conhecedor da realidade das comunidades, afirmando ser errado que a mudança de tutela e o novo regime jurídico do EPE não terem constituído as causas dos atuais problemas no ensino. Observa, no entanto, que houve uma mudança de paradigma, na qual tanto a mudança de tutela como o novo regime jurídico trouxeram mais ambição e rigor ao EPE; que a adoção do Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas (QECRL) elaborado pelo Conselho da Europa, não veio estrangeirar os jovens portugueses nem anular o ensino em Língua materna, mas sim trazer mais qualidade pedagógica. Omite-se em que se traduziu a mudança de paradigma. Esta mudança foi de facto operada com a ambição de, através da imposição ideológica dos Governos em obrigar os lusodescendentes a que no processo de ensino aprendizagem terem de aprender a Língua portuguesa como Língua de Herança (PLH) como sinónimo de Língua estrangeira (PLE), seguindo conteúdos programáticos, usando materiais didáticos, sendo avaliados com descritores avaliativos para o PLE como se fossem estrangeiros com uma competência nula em português. Na realidade, e não como omite o PS, a adoção do (QECRL) veio, na verdade, “estrangeirar” as crianças e jovens portugueses, sobretudo, na modalidade de ensino integrado onde a maioria dos alunos são estrangeiros. Além disso, como oculta o PS, veio significativamente anular a língua materna visto o ensino ser de PLE. Quanto à outra asserção no qual o (QECRL) terá trazido mais qualidade pedagógica, apraz-nos interrogar: com que fundamentação empírica (avaliação sistémica?) é produzida esta afirmação, sabendo-se que no ensino paralelo a organização dos ambientes de aprendizagem são pouco propícios a qualquer êxito nas aprendizagens, com turmas compostas por vários alunos de diferentes faixas etárias e níveis de proficiência linguística. Duvidamos, ao contrário do PS, que os professores tenham as valências competenciais adequadas em PLE para gerir em sala de aula os ambientes de aprendizagem no atual ensino paralelo.
3) “O pior mesmo é quase a xenofobia sem sentido que refere que os cursos de são dirigidos a estrangeiros e que os portugueses são discriminados ”. Esta afirmação, como foi referido, insere-se num quadro de posicionamentos de natureza linguicista (racismo linguístico) impróprios de um Partido que se advoga defensor da pluralidade e diversidade linguísticas, ao vir qualificar de xenófobos os peticionários e todos os que no CCP defendem a importância da língua materna na matriz identitária dos lusodescendentes. O PS e os Governos do PS têm nas últimas legislaturas propugnado a criação de uma Visão Estratégica Partilhada com as Comunidades portuguesas, não as subalternizando na governação de Portugal. Por isso, esperamos em breve, a este respeito, poder dialogar mais acerca dessa matéria.

Amadeu Batel, Vice-presidente do Conselho Permanente do Conselho das Comunidades Portuguesas

Pedro Rupio, Presidente do Conselho Regional das Comunidades Portuguesas na Europa

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