Ervas que crescem, abelhas que agradecem

A vegetação espontânea que floresce pela Primavera é uma excelente fonte de alimento para as abelhas e todos os outros polinizadores. As nossas cidades, vilas, aldeias e lugares precisam da “beleza espontânea” das malvas, das roseiras bravas, das margaridas e dos malmequeres, dos dentes-de-leão, da chicória e das urtigas, como partes integrantes de um ecossistema que se quer diverso. Todas elas são excelentes fontes de pólen e néctar e são as preferidas das abelhas e dos outros polinizadores. São também exemplos de vitalidade e resiliência, germinando em locais inóspitos e inimagináveis.

Além disso, fornecem valiosas informações sobre os tipos de solo em que se encontram.

De uma forma depreciativa, tratamos muitas vezes a grande variedade da nossa flora portuguesa como vulgares “ervas daninhas” ou “infestantes”. Um tratamento injusto dado às plantas silvestres, esse grande e valioso património natural, promotor da biodiversidade, do fortalecimento dos solos e de tantos benefícios para a nossa saúde. Além de funcionarem como jardins naturais, fornecem alimento a muitas espécies animais, por vezes, em quantidades muito maiores que as flores de jardim.

As suas formas diversas, cores vivas, texturas e perfumes, fazem-nos regressar às reminiscências da nossa infância.

A vegetação espontânea tem uma relação muito estreita de simbiose com os polinizadores – em troca de alimento, estes contribuem para a sua polinização.


Mas porque é que os polinizadores são tão importantes e essenciais para o equilíbrio dos ecossistemas e da biodiversidade? Em primeiro lugar, porque há várias espécies de plantas que dependem deles para se propagarem. O declínio dessas plantas será proporcional ao declínio dos polinizadores e poderão mesmo vir a desaparecer. Em segundo, porque, a diminuição da diversidade e do número de polinizadores irá ter um reflexo direto na quebra de rendimento das pastagens agrícolas.

Quando nos referimos aos agentes polinizadores estamos a falar de uma multiplicidade de seres vivos e outros elementos. Além das abelhas melíferas, muitas outras abelhas selvagens, outros insetos (vespas, borboletas e besouros), animais (pássaros, lagartos, morcegos, esquilos e roedores) e até o vento e a água desempenham um papel crucial nos processos de polinização. Uma vez que poucas plantas possuem a capacidade para se autopolinizarem, essa tarefa fica por conta dos agentes externos mencionados. Na falta desses polinizadores naturais, a polinização poderá ser feita manualmente.

Estudos recentes referem que embora as abelhas melíferas sejam muito importantes na polinização, estas, complementam, mas não substituem o papel das quase 2 mil espécies selvagens existentes na Europa.

No continente europeu, cerca de 78% das espécies de flores selvagens e 84% das espécies nos campos de colheita dependem, em parte, dos polinizadores para a produção de sementes e para uma melhor qualidade dos frutos, dos vegetais e das aromáticas. Por exemplo: laranjas, morangos, cerejas, maçãs, abóboras, tomates, pimentos, feijões, pepinos, camomila e tomilho, entre outros. Todavia, os efeitos nefastos provocados pela poluição no meio ambiente, assim como os incêndios florestais, o desmatamento acelerado, a mineração a céu aberto, a agricultura intensiva, o aquecimento global, as alterações climáticas e o uso indiscriminado de herbicidas e pesticidas, têm contribuído para a degradação de habitats e criado fortes entraves à sobrevivência das espécies polinizadoras.

Uma em cada dez espécies de abelhas e borboletas está em risco de extinção na Europa, devido às alterações do meio ambiente provocadas pelas atividades humanas supra citadas.

No caso das abelhas, o uso de pesticidas, quando não leva à sua morte, provoca sérios desequilíbrios no funcionamento das colmeias. As abelhas perdem capacidades ao nível da navegação e das aprendizagens. As larvas demoram mais de 10 horas para se desenvolverem, situação que pode levar, segundo alguns especialistas, a uma maior prevalência de pragas, nomeadamente, a varroa.

Para debelar esses problemas crescentes, serão necessárias medidas que mitiguem as suas consequências, nomeadamente: a redução ou mesmo eliminação dos vários fatores desencadeantes acima expostos; o corte tardio das herbáceas perenes, após a época da floração, nos jardins municipais e nas bermas dos caminhos e estradas e, a plantação de mais flores em jardins e hortas. Estas ações vão permitir uma maior abundância de pólen e néctar para atraírem e alimentarem os insetos polinizadores.

A ação humana no ambiente tem contribuído para a diminuição gradual da população global dos insetos, na ordem dos 2,5% ao ano, estando, 40% das espécies (onde se incluem os polinizadores) em declínio e meio milhão em risco de extinção, número que corresponderá a um terço do total.

Segundo o estudo – “Atlas dos Insetos” – desenvolvido em co-autoria pela Fundação Heinrich Boll e pela ONG Amigos da Terra, cerca de 9,2% das 2.000 espécies de abelhas e 7% das 482 classes de borboletas, essenciais para a produção de alimentos, estão ameaçadas na Europa. O estudo refere ainda que, cerca de 90% das espécies animais são insetos e estes, são muito úteis no processo de polinização, na redução de pragas e na melhoria da qualidade dos solos. Para termos uma ideia mais aproximada da importância das abelhas como agentes polinizadores, iremos referir uma problemática cada vez mais frequente, relacionada com o roubo de colmeias. Se há uns anos atrás os roubos se cingiam a motivos relacionados com a produção de mel, atualmente, assistimos a uma alteração de paradigma, devido à crescente procura dos “serviços de polinização” executados pelas abelhas, que contribuem para o aumento da produção, sobretudo, nas grandes explorações.

Atualmente, a polinização é um negócio em clara expansão.

Se por um lado assistimos a um aumento da procura por polinizadores e, por outro, estes estão em acentuado declínio, há um desequilíbrio entre os dois pratos da balança, que tem conduzido, quer ao aumento dos roubos, quer a uma escalada dos preços das colmeias em vários países.

Se os roubos e a escalada dos preços não são desejáveis, importa também destacar algumas iniciativas louváveis que têm surgido um pouco por todo o mundo, com o objetivo de defenderem as abelhas e outros valiosos polinizadores.

Começamos pela primeira ação concreta da União Europeia para proteger os polinizadores. A ideia passa por informar e consciencializar as populações sobre o declínio das espécies, mas não se fica por aqui. O objetivo último desta iniciativa é travar as suas causas, através da redução do uso de pesticidas e de um maior financiamento à investigação desta problemática. Do outro lado do Atlântico, o estado de Minnesota, nos Estados Unidos, financia a troca de relva por flores silvestres e gramíneas nativas em residências particulares, com a finalidade de atrair e salvar da extinção, abelhas e outros polinizadores, em especial uma espécie endémica, denominada Bombus affinis.

Esta espécie de zangão tem uma particularidade muito interessante e importante para a polinização – pousa nos caules floridos e produz uma vibração com uma frequência aproximada à nota musical “dó” que permite a libertação de pólen das flores, que não está ao alcance de outros polinizadores.

Regressando ao velho continente, a Foundation de France (FDF) decidiu abrir uma conta no Instagram e criou a “Bee”, a primeira abelha influencer, que, de uma forma divertida, quer salvar a sua espécie, colocando selfies e procurando demonstrar como as abelhas são importantes para a continuidade da vida no nosso planeta.

Em Portugal, o Município de Lousada e outros, optaram por não cortar a relva nem a vegetação espontânea em espaços devidamente assinalados, para fornecerem alimento aos insetos polinizadores, entre os quais, as abelhas. É importante referir ainda que, no nosso país estão contabilizadas cerca de 680 espécies de abelhas, que tal como em outras geografias, encontram-se em declínio, apesar da sua elevada capacidade de adaptação e resiliência.

Terminamos com uma curiosidade muito interessante: Uma pesquisa efetuada por pesquisadores das universidades ETH de Zurique e Paris-Saclay, demonstrou que, as abelhas Bombus terrestres, no Brasil, fazem pequenos furos nas folhas das plantas com pouco pólen para estimularem e acelerarem o crescimento de novas flores, que podem aparecer até trinta dias antes da época normal de floração.

É este o maravilhoso mundo dos polinizadores e da sua ligação à vegetação espontânea e à polinização, mundo esse que precisamos proteger. Protegendo-os, estamos a proteger-nos!

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