Nelson Ponta-Garça
San José – Califórnia
Quais são as suas origens portuguesas? Sente orgulho nessas origens?
Os meus pais são Açorianos. Eu nasci já nos EUA, embora tenha passado uma grande parte dos anos marcantes da minha juventude nos Açores e mais tarde em Lisboa antes de ir até Boston, EUA e de seguida Califórnia. Claro que sinto muito orgulho! Não só sinto orgulho como dediquei uma grande parte da minha vida a dar a conhecer as extraordinárias histórias de mérito e sacrifício dos Portugueses a residir nos EUA, quer através da RTP, quer através da série documental e de livros na saga, Heritage, History, Home da Portuguese In.
Fale-nos um pouco do seu percurso profissional.
O meu sonho de criança era ser o melhor pianista do mundo. Passei horas a aprender Chopin, Mozart, Beethoven, e mais tarde saxofone. Não me tornei no melhor pianista do mundo porque não era esse o meu destino, mas cumpri o sonho da música, tive um estúdio de gravação e produção de CDs e bandas. Toquei em bandas jazz, rock, world, pimba, rock alternativo etc. Fui professor de música, mestre de filarmónica, diretor coral, acho que até toquei ferrinhos em grupos de carnaval. Na escola secundária era um aluno empenhado e dedicado, não era o mais inteligente, mas era o melhor porque era o que mais se dedicava. Os bons alunos na altura, num país sem grandes saídas profissionais, medicina era o sonho de todos. Concorri para medicina e mesmo com média de cerca de 18 valores, não entrei, tinha 20 valores a quase tudo, mas depois correu-me mal um dos exames nacionais e não consegui. Foi aí que regressei ao meu país de origem – EUA, para seguir o sonho da música e de ser empresário.
Quem conhece o Nelson, sabe que é uma pessoa muito dinâmica, sempre envolvido em grandes desafios, recordando o grande sucesso do seu projeto reportagem/vídeo “Portuguese in Califórnia. Como surgiu a ideia? Que impacto teve esse projeto?
Este projeto surgiu na visita do Presidente da República Cavaco Silva à Califórnia. Eu já tinha fundado a minha empresa NPG Multimedia na altura e dávamos apoio ao consulado de Portugal em São Francisco, bem como a todas as organizações Portuguesas locais, na produção de audiovisual. Fui muito bem recebido e fui encorajado na altura, há cerca de 10 anos, a aprofundar este projeto que depois se expandiu para outras zonas com grande presença portuguesa: Havai, Nova Inglaterra, etc.
Agora o “Portuguese in Califórnia” em livro, foi o concretizar de um sonho? Este livro é materializar em papel aquilo que foi o trabalho em vídeo ou traz algo de novo? Qual é o público-alvo do seu livro?
Sim. Já plantei mais de 500 árvores no meu projeto de turismo Azoreszen, já tive um filho, a minha maior alegria e orgulho, e faltava o livro. A ideia do livro surgiu no sentido de imortalizar estas histórias incríveis das migrações Portuguesas. Tornar mais físico, concreto e palpável algo que o vídeo, o cinema e as séries documentais não conseguem. A primeira geração ainda gosta muito de ter algo nas mãos e não apenas algo digital.
Qual é a mensagem que pretende passar a quem ler este livro? Acha que pode ser um exemplo para os mais novos para lhes mostrar que o trabalho, dedicação e resiliência e também talento, dão frutos?
Sem dúvida. Acho que acima de tudo, um diretório e um documento histórico de registo das principais figuras Portuguesas neste estado dos últimos 100 anos. Serve de inspiração porque a maioria destas pessoas incríveis chegou aos EUA sem nada e construíram grandes impérios de uma forma honesta e digna, que inspira não só os mais jovens, mas qualquer ser humano.
Sabemos que regressou a Portugal com a família, foi um adeus à Califórnia ou continua a manter ligação e presença nos Estados Unidos?
Esta deve ser a pergunta que me costumam fazer que mais me aborrece. Eu passei uma vida a ligar e a fazer uma ponte entre os dois países. Às vezes passo mais tempo em Portugal, tem sido o caso agora por causa da Covid-19, os Açores são um lugar fantástico e em alturas pandémicas ainda mais, mas continuo com a minha empresa nos EUA, tal e qual como quando saí. As pessoas têm sempre a necessidade de colocar um rótulo nas coisas, eu sou um cidadão do mundo e se Deus quiser, continuarei a viver entre os dois países. Não sou mais nem de um, nem de outro, não gosto mais de um, nem de outro, sou dos dois, gosto dos dois. Acho que quem migrou se sente assim para toda a vida, nunca estará bem apenas num lugar.
O regresso a Portugal era um sonho adiado ou foi uma opção por algum motivo ou desafio em especial?
Eu desde que fui para os EUA, que todos os anos voltava a Portugal, às vezes duas vezes por ano, se não vinha mais era porque não podia. Nunca tive aquele sonho de poupar e regressar a Portugal na reforma. Eu estava focado nos EUA e nem pretendia ter em Portugal residência. Com a morte do meu pai e nascimento do meu filho fiquei com mais vontade de investir em Portugal e assim o tenho feito.
Se tivesse que estabelecer diferenças do que mais gosta e menos gosta em Portugal e nos Estados Unidos, que aspectos positivos e negativos apontaria?
A desvantagem de conhecer outros mundos é que depois nunca se está satisfeito com o que se tem, e isso é mau.
Em Portugal dizem-me várias vezes, “Não penses que estás na América, isto aqui é assim, não é como na América”. Acho que tenho dado um contributo para que se veja a migração Portuguesa de outra forma, com mais respeito.
Em Portugal o que mais me incomoda, e acho que a todos, é a burocracia, a papelada. O que mais gosto, não é fácil de descrever aqui em breves palavras. Amo este país e amo os Açores. Nos EUA amo as oportunidades que são dadas a quem as queira aproveitar.
Que projetos tem reservado para este futuro próximo?
Só Deus sabe. Mas entre a continuação da Saga “Portuguese In” em outras regiões em documentários, livros, continuação das minhas empresas em Portugal e EUA, e sobretudo, ser um bom pai. Como eu digo sempre, não farei o que eu quero, farei apenas o que me deixarem. Em Portugal é assim. Nos EUA continuarei a fazer a ponte e este network mundial com a comunidade portuguesa espalhada pelo mundo. E essa é a minha grande paixão, e depois terei outros projetos para poder pagar as contas, naturalmente.
O Nelson sempre manteve uma relação de grande proximidade com as comunidades portuguesas residentes nos Estados Unidos, nomeadamente, empresários, dirigentes associativos, artistas, entre outros, continua a ter esta proximidade com as recentes mudanças na sua vida? De que forma?
Sim claro, sempre. Cada vez mais com a globalização e digitalização, não interessa muito onde se está. Agora mesmo estou a escrever esta pequena reflexão/entrevista para a revista Descendências Magazine, no meio do atlântico, num sítio remoto que poucos conhecem, amanhã estarei num dos centros mundiais em Hollywood, Los Angeles. Estou no meu último mandato como conselheiro das comunidades Portuguesas, representando a Califórnia e os 13 estados de jurisdição daquele consulado, um dos maiores em todo o mundo, fui também Vice-presidente do CCP. Mas, enganem-se aqueles que pensam que eu preciso de títulos oficiais para representar a minha comunidade, já o fazia antes de ser eleito e assim o farei depois, enquanto o desejarem.
Como vê atualmente a realidade do movimento associativo na comunidade portuguesa dos Estados Unidos?
Muito mal. Vão-se perder em poucos anos décadas de suor e lágrimas dos nossos antepassados. Mais não digo!
O regresso a Portugal é hoje um desafio colocado às nossas Comunidades Portuguesas espalhadas pelo mundo, inclusivamente com programas específicos do governo português para incentivar ao regresso. Como olha para este desafio? Que mensagem gostaria de deixar aos nossos concidadãos que desejam regressar a Portugal?
O regresso a Portugal será cada vez mais uma realidade e os números cada vez maiores sobretudo, pelo facto de Portugal ser hoje um país muito melhor para viver e muito mais apelativo a Portugueses e a outras nacionalidades. A grande dificuldade é mesmo a burocracia, o choque cultural e a falta de comunicação. De resto, viver em Portugal são só vantagens.
Obrigado por esta oportunidade, felicitando o Nelson por todo o trabalho que tem desenvolvido junto da comunidade portuguesa a residir no estado da Califórnia, desejando os maiores sucessos pessoais e profissionais.
Obrigado e parabéns à Descendências Magazine pelo trabalho que tem feito. Obrigado pela oportunidade.