Obra de Capa

Obrigado Pai

Basta apenas um olhar, pai, para que nele se traduzam todas as palavras que ao longo dos tempos estive guardando para lhe oferecer. Basta olhar para si para o amar cada vez mais. Basta olhar os calos das tuas mãos para aperceber-me do sangue que verteram para me oferecer o pão-nosso-de-cada-dia. Basta escutar o teu silêncio, pai, e ver o teu olhar longínquo, para saber das lutas que travaste para que eu estivesse aqui, altivo, digno herdeiro do teu apelido ronga. Todos os dias reescrevo um poema para te oferecer, pai. Mas as palavras recusam­-se a erguer-se até à tua dimensão. Agora, ao olhar-te de novo, sei que nunca serei capaz de aperfeiçoar esse verso que busco com a ansiedade dos poetas. Mas deixa-me dizer obrigado, pai, por tudo aquilo que fizeste por mim. Aprendi muito enquanto passeávamos pelos campos a ensinar-me como se lia os sinais da natureza: a proximidade da chuva, a eminência do vento e o significado das nuvens. Agradeço-te, sobretudo, por ter-me ensinado a linguagem dos afetos, através da qual aprendo a amar cada vez mais o mundo.

Marcelo Panguana


Marcelo Panguana

Nasceu na cidade de Lourenço Marques. Cronista, poeta, autor de contos reconhecido internacionalmente. Nas estantes das livrarias pode-se encontrar diversas publicações da sua autoria: coletâneas de contos, romances, um livro de entrevistas, uma história de literatura infantil e uma recolha de contos tradicionais. Recebeu em 2005 o Prémio Rui de Noronha concedido pelo FUNDAC. Foi-lhe atribuído em 2011 uma menção honrosa no Grande Prémio SONANGOL de Literatura. 



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