Poesia – Alda Lara

Regresso

quando eu voltar,
que se alongue, sobre o mar,
o meu canto ao creador!
porque me deu, vida e amor,
para voltar…

voltar…
ver de novo baloiçar
a fronde magestosa das palmeiras
que as derradeiras horas do dia,
circundam de magia…

regressar…
poder de novo respirar,
(oh!… minha terra!…)
aquele odor escaldante
que o húmus vivificante
do teu solo encerra!

embriagar
uma vez mais o olhar,
numa alegria selvagem,
com o tom da tua paisagem,
que o sol,
a dardejar calor,
transforma num inferno de côr…

não mais o pregão das varinas,
nem o ar monótono, igual,
do casario plano…
hei-de ver outra vez as casuarinas
a debruar o oceano…

não mais o agitar fremente
de uma cidade em convulsão…
não mais esta visão,
nem o crepitar mordente
destes ruídos…

os meus sentidos
anseiam pela paz das noites tropicais
em que o ar parece mudo,
e o silêncio envolve tudo

sêde… tenho sêde dos crepúsculos africanos,
todos os dias iguais, e sempre belos,
de tons quasi irreais…
saudade… tenho saudade

do horizonte sem barreiras…,
das calemas traiçoeiras,
das cheias alucinadas…
saudade das batucadas

que eu nunca via
mas pressentia
em cada hora,
soando pelos longes, noites fora!…

sim! eu hei-de voltar,
tenho de voltar,
não há nada que no impeça.
com que prazer

hei-se esquecer
toda esta luta insana…
que em frente está a terra angolana,
a prometer o mundo

a quem regressa…

ah! quando eu voltar…
hão-de as acácias rubras,
a sangrar
numa verbena sem fim
,

florir só para mim!…
e o sol esplendoroso e quente,
o sol ardente,
há-de gritar na apoteose do poente,

o meu prazer sem lei…
a minha alegria enorme de poder
enfim dizer:
voltei!…

Alda Ferreira Pires Barreto de Lara Albuquerque (1930/1962)

Poeta da Geração Mensagem, a sua poesia transpira exílio, saudade obsessiva da terra e suas gentes, os lugares da infância, os amigos e as expectativas de um futuro em que pretendia participar logo que possível faz de Alda Lara, uma mensageira da sociedade civil, lutando com as armas de que dispunha a sua poesia, onde a política, estando implícita, é sobretudo do foro dos sentimentos.

Esta rubrica pretende dar a conhecer ao mundo o melhor da poesia por diversos autores lusófonos. Os poemas são selecionados por Gilda Pereira, uma fã incondicional de poesia.

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