Sofia Dias Cassimo

African Women in Business

Com um percurso ímpar, Sofia Dias Cassimo demonstra com sucesso que o empreendedorismo pode surgir na vida a qualquer momento independentemente dos estudos que se faz.
Filha de pais professores universitários e de avós médicos moçambicanos, Sofia nasceu na Rússia quando os seus pais foram estudar lá na época da Pós-Independência, ficou apenas dois meses e regressou a Maputo onde vive atualmente. As avós dela tiveram o impacto muito grande na vida dela porque cuidaram dela enquanto os pais estudavam, elas ensinaram-lhe que era sempre possível dar o seu melhor consoante a necessidade do momento.
Eram avós dinâmicas, a avó materna era médica e Sofia ia ter com ela depois da escola no hospital, a avó paterna era dona de casa e uma fantástica cozinheira, fazia bolos que vendia com muito sucesso na época, já tinha o seu micro negócio que permitia ser independente.

Sofia Dias Cassimo tirou o curso de medicina mas nunca praticou, já no terceiro ano, sabia que não queria praticar enquanto médica mas gostava das pessoas, tinha esse espírito altruísta e queria fazer a diferença no que fizesse, no dia-a-dia, provocando impacto. Obteve créditos de forma complementar na Faculdade de Economia, Farmácia e Psicologia, em Coimbra, que lhe orientou para a área onde trabalha hoje, o Desenvolvimento. Presidente do Departamento dedicado às mulheres no seio da Confederação das Associações Económicas do Moçambique, equivalente ao MEDEF em França, Sofia Dias Cassimo representa FEMME, a Federação Nacional das Mulheres no Comércio cujo escopo é principalmente acompanhar as mulheres no desenvolvimento da empresa. A Confederação tem um papel importantíssimo no desenvolvimento económico do país porque todas as leis e estratégias que afetem o sector privado relativas à economia decididas pelo governo devem ser consultadas pela Confederação.


Como surgiu a ideia da empresa SamSara e Sublime?

Sublime surgiu em 2013 até 2020, promovia a cozinha moçambicana e de fusão, a comida é a minha felicidade e por entender que havia necessidade desse mercado, comecei a partir da minha casa com a minha colaboradora doméstica e depois com outras mulheres, no segundo ano, orientámos muito a empresa para o nível corporativo porque havia falta de empresas de Catering que focasse nesse nicho, muito rapidamente tornámos uma empresa de Catering de nicho ( Embaixadas, Banca maioritariamente) mas fechámos a empresa devido à Covid. Foi uma decisão muito dura porque a empresa era lucrativa mas como a logística era grande, a gestão consumia-me muito e não tinha tempo, além disso, a nossa gestora já não tinha disponibilidade porque estava doente, tomei a decisão de fechar, é importante referenciar que como empreendedores ou fundadores de negócios, às vezes, temos medo em ser cirúrgicos a este nível e aguentámos ali até que o buraco seja tão fundo que nós também já estamos consumidos, antes que isso chegasse, preferi fechar, garantir que as minhas cinco colaboradores tivessem outro emprego, pagámos as contas e caminhámos para o futuro. Havia um lado social também porque empregava mulheres permitindo que tivessem aulas à noite e se quisessem continuar o ensino superior, ajudava-lhes a pagar os estudos.
Quando regressei para Moçambique, depois de terminar os estudos, trabalhei num grande projeto ONG Global Initiative NTD que era das Doenças Tropicais Negligenciadas e foi a minha licenciatura em termos de gestão de projeto, em desenvolvimento, apanhei toda essa capacitação que foi feita para a equipa, desde como o projeto ia ser implementado, quais eram as fases, quais eram as equipas, quem ia ser contratado, como se ia para cada zona, era um projeto que tinha um impacto rural, isso ajudou-me a perceber o que existia ou não no país, foram anos de experiência em que me apercebi que tinha poucas empresas ou organizações moçambicanas que trabalhavam nesta área conciliando pesquisa, acompanhamento e gestão do governo. Surgiu a ideia da criação de Samsara, em 2014, onde se faz consultoria e assessoria para estas agências de desenvolvimento ou ONG que queriam entrar em Moçambique e que precisavam de alguém, um intermediário que permitiria uma gestão mais suave, principalmente na parte inicial do projeto, é a primeira empresa de impact investing moçambicana.
O objetivo é criar impacto social e económico focando no acompanhamento e investimento das startups ligadas ao desenvolvimento sustentável, a igualdade dos géneros, a redução da pobreza e ao desenvolvimento do sistema de saúde. Na SamSara fazemos investimentos de impacto mas com valor partilhado, garantir que o lucro exista e agarrar as grandes oportunidades. Moçambique está cheio deles: petróleo, gás, agricultura, temos muitos investimentos estrangeiros IDE que estão a entrar, no entanto, é necessário garantir este investimento, feito de forma sustentável e de forma que garanta a dignidade das pessoas que estão à volta, garantir que o impacto daquele negócio, daquele investimento vai ser mais para a comunidade, mais para a empresa. Existem investidores no mundo que têm dinheiro disponível e para eles importa estar a investir algo que vai ter impacto social, algo que vai ter impacto positivo para o ambiente.

Porque a FEMME tem um papel importante?

A Femme tem dois ramos específicos: advocacia pelos direitos das mulheres no setor privado, como garantimos que as mulheres têm acesso aos mesmos tipos de oportunidades do que os homens, garantir que temos representatividade nos fóruns onde é decidido ou pensado ou é preciso influenciar algum tipo de políticas ou de legislação que tenha impacto direto no setor privado. A CTA tem um papel muito ativo com o governo, sempre que é preciso rever uma lei ou um tipo de política, deve-se lidar connosco, tem que haver um consenso para que aquela lei avance, depois a Femme tem a parte de suporte, garantir que através de parcerias com entidades ou organizações fazemos programas de capacitação ou também de networking para que se concretize negócios com outras mulheres.

Porquê o empreendedorismo em Moçambique?

É um país extremamente empreendedor com índice de Desenvolvimento Humano um pouco baixo mas com muito potencial a nível de população ativa, o alto emprego claramente vai ser uma das vias que nós vamos ter para garantir a estes jovens (14 milhões), porque não temos para eles mercado de trabalho suficiente, então o auto-emprego vai ser de certeza, o nosso pensamento sempre foi « que tipo de empreendedorismo queremos promover, que metodologia de ensinamento, passar e suportar o empreendedorismo » daí também a parceria com a IdeiaLab onde trabalho ativamente e onde estou dentro dum departamento específico que é do empreendedorismo feminino e onde trabalho nesse universo orientado para as mulheres, por isso, segmentei a SamSara ficando ela virada para consultoria, desenvolvimento e criei a SIGG (Solutions Igniting Growth) em 2021 com ligação direta a agências de desenvolvimento, o investimento entra aqui porque chega uma altura em que os empreendedores precisam de investimento e o nosso mercado a nível de banca comercial está muito limitado, as taxas de juro são altas e o investimento de impacto como forma de capital de risco é uma alternativa que possivelmente os empreendedores têm, junto das entidades legais rever a legislação, é preciso ser aplicada para garantir que vai ser viável, a maior parte do investimento em Moçambique é pensado a nível muito grande que é o investimento direto estrangeiro, estamos a falar de construção de pontes por exemplo, então como podemos pensar e viabilizar de uma forma de legislação e de regulamento para que isso possa acontecer.

Em Moçambique, as mulheres conseguem manter o seu próprio negócio, têm acesso ao financiamento com mais facilidade agora?

As mulheres são as mais empreendedoras em Moçambique, é um país cuja economia tem um grande nível de informalidade e nessa informalidade, 87% é feminina, não é difícil para elas começarem negócio, a questão é distinguir um negócio que tenho por necessidade, outra coisa são aqueles negócios pensados a nível de oportunidade, é verdade que existe uma percentagem destas mulheres que evoluem e que passam por negócios de crescimento mas são muito poucos.
A parte dos negócios de crescimento já é diferenciado, o digital também veio trazer influência nisso, hoje em dia, posso fazer negócios em qualquer sítio do mundo através do Instagram, do Facebook, então o que nós temos em Moçambique é que para as mulheres empreendedoras não é a questão do começar, claro que sem dúvida, o acesso ao financiamento é limitado mas não é exclusivo das mulheres, é para todos os empreendedores, pelo tipo de banca e do sistema financeiro que temos, há pouco capital de risco disponível, por isso enquanto Femme e CTA estamos sempre a fincar o pé, é uma luta há mais de cinco anos, criar este tipo de modelo dentro da legislação financeira para termos capital de risco com Business Angels por exemplo que não está prevista na legislação, isto é, não há nada feito de uma forma estruturada e não conseguimos medir, não conseguimos acompanhar, portanto não temos dados sobre isso. Para empreender em Moçambique não é o começar o difícil é o manter e o crescer, é o que focamos com investimento e acesso ao financiamento, como podemos garantir que os negócios virem empresas e que essas empresas se mantenham no mercado crescendo a nível regional e internacional. A nível de médias e grandes empresas, a maioria é masculina, as mulheres estão muito nos micro e pequenos negócios.

Quais são os conselhos que daria às mulheres que queiram empreender em Moçambique e queiram crescer?

O essencial é a colaboração, acho que culturalmente temos que mudar um pouco isso, fazer parcerias e mais parcerias com mulheres, o sucesso dos negócios passa por fazermos parcerias estratégicas, não estarmos tão isoladas, sozinhas, o mercado já é tão difícil, duro e vulnerável que se conseguirmos ter essa unidade, essa colaboração, os riscos são minimizados.
Uma colaboração numa lógica de parcerias estratégicas.
A visibilidade, a oportunidade de mostrarmos, existirmos no mercado, seja nas redes sociais, seja nos eventos, nos fóruns, é importante para aproveitar as oportunidades, isso passa muito também pela colaboração.

Qual é o seu sonho agora?

Criar um Hub de empreendedorismo dedicado às mulheres já não é um sonho mas algo que planeámos lançar em 2024. Como « IdeiaLab » somos a entidade que tem mais programas diversificados para diversos tipos de público de mulheres, temos muita informação das necessidades, do que existe e não existe, de como vamos viabilizar isso, como tornámos isso sustentável e principalmente replicável, não queremos que fique unicamente em Maputo, tem que ser replicável em outras partes do país para outras mulheres terem acesso, foi o que nos gastou mais tempo mas agora estamos à procura de parceiros que se queiram juntar a nós para viabilizarmos diferentes pilares que nós temos de orientação dentro do Hub não só numa vertente de capacitação mas de networking de exposição dos negócios das mulheres, elas terem um espaço para elas, usarem um Business Center, por exemplo, para trabalhar, afinal o Hub é mesmo o mundo das mulheres disponível para as mulheres.
O meu maior sonho agora é lançar internacionalmente o modelo digital de implementar o FEMTECH, um programa que se aprimorou e que ajudei a fazer crescer para mulheres empreendedoras, é um programa que não olha unicamente para o negócio mas tem essa componente de desenvolvimento pessoal da mulher, existem muitas carências limitantes nas mulheres empreendedoras, são as maiores barreiras para o crescimento, 90% das mulheres com o programa, dois anos depois, duplica no volume de negócios e já contratou pelo menos duas pessoas, tem um impacto muito importante, estamos a levar o FEMTECH para países de expansão portuguesa em primeiro lugar e depois a nível regional. O meu maior sonho é ver esse programa pelo mundo inteiro, tem uma ótima oportunidade em franchisar o programa.

Qual é a mensagem que quer deixar à comunidade lusófona?

Queria lançar um desafio a todas as mulheres que falem português, estarmos mais juntas e mais próximas umas com as outras porque se estivermos unidas, poderíamos aumentar essa questão de representatividade em espaços em que são tomadas decisões importantes.
Existe realmente grandes oportunidades em fazer negócios juntas, tirar partido da língua porque temos acordos bilaterais de comércio e assim juntas, crescemos muito mais rápido.
A minha mensagem é « vamo-nos conhecer via LinkedIn, seja quem eu for, procurar alguém que possa introduzir num país que queira ir, fazer negócios nesse sítio porque o mercado é realmente bastante restrito, se formos migrando ou experimentando outros países, esta lógica de crescimento para fora é mais fácil do que no mercado interno, temos muitas vantagens nisso, precisámos de sermos mais céleres a aproveitar essas oportunidades. »

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