Fundo Ambiental

Receitas, despesas e opacidade!

De onde vem e para onde vai? Quem decide, onde e quanto é gasto? Que benefícios têm existido para o ambiente? Estas são algumas das questões que se colocam em relação ao Fundo Ambiental, que devido à sua grande abrangência, não pode ser uma espécie de “saco azul” forrado com “verdes intenções”!

Em 2020, o Fundo Ambiental financiou-se através dos leilões CELE (88%), taxa de resíduos hídricos (7,6%), taxa de gestão de resíduos (3,4%), coimas e penalidades (0,6%), reposição não abatida de pagamentos (0,2%) e juros (0,1%). Como se pode verificar, a grande fatia das receitas do Fundo, provém dos leilões realizados no âmbito do CELE, isto é, do comércio de licenças de emissão de gases com efeito estufa, regulado pelo Decreto-Lei n.º 38/2013, em transposição da diretiva comunitária 2009/29/CE.

Do lado da despesa, para o mesmo ano, no pódio das despesas do Fundo Ambiental, o destaque foi para a ação climática (339.25 milhões de euros), apoios tarifários (151,56 milhões) e recursos hídricos e sustentabilidade dos serviços de água (37,24 milhões). Seguiram-se a conservação da natureza e biodiversidade (17,81 milhões), outros (11,73 milhões), recuperação de danos ambientais (5,93 milhões), resíduos e economia circular (3,22 milhões), sensibilização ambiental (1,74 milhões) e cooperação (1,33 milhões).
Incentivos à aquisição de veículos elétricos e híbridos, construção de ciclovias, subsídios a produtores de energia através da queima de resíduos, apoios à eficiência energética das habitações, aquisição de comboios e autocarros de transportes públicos, expansão das linhas de metro e redução do preço dos passes, entre outros, têm sido alguns dos beneficiários diretos dos milhões provenientes do Fundo Ambiental.

Outro dos benificiários, no ano transato, foi a Companhia Silvo-Agrícola da Beira (Cosabe), do Grupo Amorim, proprietária da Herdade da Baliza, no Parque Natural do Tejo Internacional, que recebeu 438 mil euros, cerca de um terço dos 1,46 milhões disponibilizados pelo Fundo Ambiental para 2020, destinados à substituição de eucaliptais por espécies autóctones.
Segundo o Governo, o nível de execução da despesa situou-se nos 99,9%, ou seja, 569,8 milhões de euros. Em 2019 foram executados apenas 387,6 milhões. Aqui importa perceber em que medida estes apoios se traduzem em ganhos ambientais. Um simples exemplo: a renovação das frotas de transportes públicos e a redução do preço dos

passes tem levado a uma maior utilização dos mesmos e a uma redução do uso do transporte individual, verificando-se, desse modo, uma redução das emissões de carbono para a atmosfera.
Atualmente, encontra-se em execução o “Programa de Apoio a Edifícios mais Sustentáveis”, que conta com uma dotação de 9 milhões de euros, para 2020 e 2021, disponíveis para candidaturas de particulares que pretendam colocar painéis fotovoltaicos, painéis solares, bombas de calor e mudança de janelas, para tornarem as suas habitações mais eficientes a nível energético. As verbas de 4,5 milhões de euros correspondentes a 2020 já se encontram esgotadas, aguardando-se para março a reabertura do programa com igual montante, correspondente à verba destinada a 2021.

Em 2020 foram também disponibilizados 4 milhões de euros para a compra de bicicletas e automóveis elétricos, mais 1 milhão que em 2019. Para 2021, o valor será novamente de 4 milhões.
Segundo o Ministro do Ambiente e da Ação Climática, Matos Fernandes, para 2021 prevê-se que o fundo venha a ter um encaixe de cerca de 571 milhões de euros, o valor mais alto desde que foi criado, sendo distribuído da seguinte forma: apoio à redução tarifária nos transportes públicos (198,6 milhões de euros), programas de redução do défice tarifário (153 milhões), sustentabilidade dos sistemas de água (22 milhões), apoio à densificação e reforço da oferta de transporte público (15 milhões), apoio à implementação de projetos de recolha seletiva de bio resíduos (11,9 milhões), programa de apoio à aquisição de veículos de baixas emissões (4 milhões) e, ainda, 1 milhão de euros para cada um destes projetos: limpeza de praias no Inverno, melhoria das condições de visitação de áreas com elevado valor natural e instalação de equipamentos destinados ao estacionamento de bicicletas.
Mais concretamente, o Fundo Ambiental servirá, este ano, para financiar a expansão da linha do Metro de Lisboa, num investimento a rondar os 210 milhões de euros, dos quais 172 milhões serão provenientes do Fundo e os restantes 83 milhões do fundo de coesão POSEUR. Importa referir que, em 2020, na sequência da pandemia, quer o Metro de

Lisboa, quer o do Porto, tiveram uma redução do número de passageiros na ordem dos 50%, segundo informações tornadas públicas pelos respetivos presidentes.
Cerca de 10,5 milhões de euros serão utilizados na redução dos preços da eletricidade.
Todavia, a opacidade tem acompanhado o Fundo Ambiental desde a sua criação.
Várias organizações ambientalistas (QUERCUS, GEOTA, SPEA, FAPAS, ANP/WWF e LPN), numa Carta Aberta dirigida ao Ministro do Ambiente e da Ação Climática, denunciaram alguma “falta de transparência” na gestão do Fundo, sendo que, nos últimos quatro anos, apenas 2% terá sido aplicado no apoio a projetos de conservação da natureza e da biodiversidade. Referiram ainda o desfasamento entre a realidade e os dados apresentados no Parlamento pelo Ministro. Em concreto, mencionam que, em 2020, o Fundo Ambiental não gastou 17,8 milhões de euros na conservação da natureza, pois, no orçamento aprovado pelo Despacho n.º 8457/2020 estavam previstos apenas 9,47 milhões (1,64% do total do Fundo). Além disso, 8,5% do orçamento – 49,149 milhões de euros – serviram para financiar ações e projectos aprovados por protocolo, sem que tenha havido concurso público. Em resposta, o Governo justificou essas discrepâncias devido a atrasos e adiamentos resultantes da Covid-19.

Por outro lado, outra ONG ambientalista, a Zero, num documento enviado aos partidos aquando do debate da especialidade do Orçamento de Estado para 2021, chegou mesmo a pedir um “escrutínio mais apurado” a esse mesmo Fundo. A associação referiu que devido à sua dimensão alargada, por integrar, a partir de 2016, o Fundo de Apoio à Inovação, o Fundo para a Sustentabilidade Sistémica do Sector Energético, o Fundo Florestal Permanente e o Fundo para a Eficiência Energética, urge uma maior transparência, na angariação e no uso das verbas. Alerta também para a não existência de garantias para a sustentabilidade futura do Fundo, pois prevê-se uma redução das receitas em consequência da redução das emissões de carbono, existindo assim um risco real acrescido de se pretender manter as emissões para garantir as receitas.

Também no Parlamento, da esquerda à direita, se têm levantado vozes contra o modo como tem sido gerido o Fundo Ambiental, que, aparenta funcionar como um “grande saco”, um “poço sem fundo” e uma espécie de orçamento paralelo ao do Ministério do Ambiente, sem que esteja sujeito ao escrutínio da Assembleia da República.
Para colmatar esta aparente opacidade na gestão do Fundo Ambiental, o Governo criou, no início deste mês de fevereiro, uma ferramenta interativa (https://atividade.fundoambiental.pt) onde é possível consultar a proveniência e a aplicação das receitas, desde 2017 até 2020. Relativamente a essa ferramenta, importa referir que, os gráficos das receitas e despesas são apresentados de uma forma muito vaga, tendo por base grandes rubricas, não sendo possível aferir com exatidão onde os milhões são efetivamente gastos.

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