A escassez de água em Portugal
A água é fonte de vida, um bem essencial em si e fundamental para a produção de vários recursos, desde a produção de alimentos até à energia eléctrica, entre outras utilizações. Devido à sua importância vital, este recurso insubstituível, precisa ser preservado e bem gerido.
A vulnerabilidade de Portugal face às alterações climáticas tem-se evidenciado nas sucessivas secas que se têm feito notar ao longo dos últimos anos. O problema não é de hoje e a tendência é para que se agrave no futuro. A proximidade do país, a par com outros do Sul da Europa, com os desertos do Norte de África, contribui, fortemente, para o agravamento desta situação. As previsões para os próximos tempos apontam para menos chuva e verões mais secos, assim como, temperaturas mais elevadas.
Estas alterações climáticas vão contribuir, em grande parte, para o avanço da desertificação, com a consequente destruição dos ecossistemas e a redução da produção agrícola, não só para a alimentação das pessoas, mas também para a dos animais.
Perante este cenário, urge a implementação de usos mais sustentáveis dos recursos hídricos, pois, Portugal está a usar mais de 40% da quota disponível. Este valor é preocupante, porque está acima dos valores definidos para a gestão dos períodos de seca. Se os baixos níveis de pluviosidade podem ser apontados como responsáveis pela situação de escassez de água no panorama geral, no que respeita às barragens, outras causas poderão ser complementares, como sejam, o forte incremento na produção eléctrica, para colmatar as necessidades decorrentes do fecho das centrais a carvão de Sines e do Pego, e os elevados consumos associados às plantações intensivas e ao uso para a agricultura.
Por outro lado, também existe muito desperdício nas condutas de distribuição de água para consumo humano. Na presença destes dados preocupantes, é preciso adoptar um consumo responsável e com uma clara aposta na eficiência na gestão dos recursos hídricos.
Um estudo recente da Fundação Calouste Gulbenkian revelou que, Portugal, enfrentará sérios riscos de escassez de água até 2040, podendo este precioso líquido faltar, até para as actividades mais básicas. Posto isto, para evitar esta situação de stress hídrico, será necessário, além de se aprimorar a gestão deste recurso, é também necessário antecipar as consequências, para que se possa dar uma resposta mais adequada ao problema.
A falta de água poderá colocar em risco a nossa saúde e a produção de alimentos, que por sua vez terá implicações na perda de postos de trabalho ligados ao ramo da agricultura e no decréscimo gradual da criação de riqueza, afectando, sobretudo, as comunidades locais.
Em Portugal, a agricultura e a pecuária, sobretudo em regimes intensivos (é preciso que se diga), consomem cerca de 75% dos recursos hídricos do país. A média da União Europeia, situa-se nos 24%. A grande parte destes gastos não é medida, pelo que será desejável a implementação de soluções tecnológicas tendo em vista uma melhor eficiência na utilização da água, indo de encontro a um desenvolvimento mais sustentável.
Como diz o povo, e bem, “só percebemos o valor da água quando a fonte seca”. Para termos uma ideia mais realista da importância da preservação da água doce, importa referir que, dos ¾ da superfície da terra que são ocupados por água, apenas 3% é água doce, e destes, apenas 1% está disponível para a população, pois os outros 2% estão congelados nas calotas polares.
Para colmatar a falta de água doce, uma das soluções encontradas e adoptadas, passa pela dessalinização da água do mar. Apesar de este processo representar custos elevados, já é utilizado na ilha de Porto Santo e estão a decorrer experiências no Algarve.
Os primeiros dois meses deste ano 2022 foram marcados por baixos níveis de pluviosidade. Segundo dados do IPMA, o mês de Janeiro foi considerado o 5.º mais quente, desde o ano 2000, e o segundo mais seco, de tal modo que, a temperatura máxima foi mesmo a mais alta dos últimos 90 anos. Uma parte considerável do território continental português apresentou seca severa ou extrema, sobretudo a sul. Os vários níveis de seca são definidos pelo Índice de Palmer, que aglomera três indicadores: quantidade de água no solo, temperatura e precipitação.
Tomando por base um estudo da APA, Portugal perdeu, nos últimos 20 anos, cerca de 20% dos seus recursos hídricos. Para remediar este decréscimo galopante é urgente utilizar a água com parcimónia, promover a reutilização da mesma e a sua retenção em barragens.
Os baixos níveis de água apresentados pela maioria das barragens portuguesas foram, recentemente, objecto de algum mediatismo nos media e de autênticas romarias de turistas. Em Janeiro, a barragem do Alto Rabagão, em Montalegre, estava a 20% da sua capacidade máxima. A média dos meses de Janeiro em anos anteriores rondava os 65%. Noutras barragens, com a descida das águas, foi possível observar algumas aldeias que tinham sido alagadas aquando da construção das mesmas. Vilarinho das Furnas, no Gerês, e Vilar da Amoreira, em Pampilhosa da Serra, são apenas dois exemplos. Na Galiza, a aldeia de Aceredo, banhada pela Barragem do Alto Lindoso, voltou a estar a descoberto.
O autor não aderiu ao novo acordo ortográfico
Para fazer face a esta situação de seca, que não é um fenómeno raro em Portugal e, com os níveis das barragens em mínimos históricos, o Governo português viu-se na necessidade de suspender a produção hidroeléctrica para que não houvesse interrupções no fornecimento de água para consumo humano. Para isso, foram definidas cotas e volumes de água a partir das quais o seu uso fica condicionado para o desenvolvimento de outras actividades relacionadas com a rega e com a produção eléctrica. No entanto, estas medidas serão apenas paliativas, mitigam temporariamente o problema, não o resolvem, de todo. Perante esta catástrofe ecológica, não se entende a pretensão deste mesmo Governo em avançar com outra catástrofe – a instalação de explorações mineiras a céu aberto, próximas de algumas destas barragens, que além de produzirem toneladas de resíduos tóxicos, consomem e contaminam milhões de litros de água.
Assim sendo, o que nos reserva o futuro? As previsões apontam para secas mais duradouras, mais intensas e mais frequentes, que exigirão respostas mais adequadas e mudanças de fundo, no sentido de se processarem as adaptações necessárias às novas realidades. A seca em Portugal tem apresentado efeitos desoladores. Há produtores a venderem os seus animais, por não terem comida para lhes dar e culturas alimentares a perderem-se, por falta de água. No limite, a manterem-se estes níveis de seca, com baixas reservas, poderá desencadear-se uma subida nos preços deste bem essencial, como medida regulatória para moderar os consumos, uma situação que iria agravar ainda mais a difícil situação económica de muitas famílias portuguesas.