Mensagem do Presidente Philippe Fernandes
Terror e morte em Myanmar
Tudo deve ser feito para se conseguir o fim da guerra na Ucrânia e tudo devemos fazer para ajudar os ucranianos nesta luta e mais tarde na reconstrução do seu país. No entanto, existem outras atrocidades por esse mundo fora que merecem igualmente a nossa atenção e intervenção. A AILD tem vindo a denunciar a perseguição em curso de milhares de lusodescendentes católicos (bayingyis) em Myanmar (antiga Birmânia), que se tem traduzido em destruição generalizada, mortes e refugiados. O nosso diretor geral da Ásia Pacífico, o investigador Joaquim Magalhães de Castro, conhece bem as aldeias onde vivem há quase 450 anos esses descendentes de aventureiros portugueses de antanho. Desde a década de 1990, Magalhães de Castro tem divulgado a existência dos bayingyis juntos dos mais diversos media, através de mostras fotográficas, livros e até um documentário. Infelizmente, nunca foi prestada grande atenção a este tema, por quem de direito, e o habitual alheamento sobreveio. Só em Janeiro de 2020 este povo voltou a ser notícia, desta feita por intermédio da National Geographic. Os bayingyis constituem a mais antiga comunidade católica de Myanmar e perfazem pouco mais de meio milhão de pessoas num país predominantemente budista. Ainda hoje os bayingyis evidenciam traços ocidentais característicos: olhos castanho-claros, verdes ou até azuis, a pele mais clara, narizes proeminentes e os corpos mais peludos do que o comum birmanês. Assumem orgulhosamente a sua ascendência lusitana e mantêm algumas tradições portuguesas, como é o caso do fabrico artesanal de enchidos e de doces. Até 1970 o Governo local não reconhecia, de facto, os bayingyis como parte da população birmanesa, sendo considerados uma espécie de estrangeiros devido às suas características fisionómicas. Desde dezembro do ano passado os esbirros da Junta Militar de Myanmar têm vindo a atacar as diversas aldeias bayingyis, afetando a vida de “várias dezenas de milhares de pessoas”. A aldeia de Chaung Yoe foi o primeiro alvo da violência e saque, donde resultaram 300 casas destruídas muitas delas à bomba. Seguiu-se Chan-tha-ywa, em janeiro passado: “Os soldados ocuparam toda a aldeia, saqueando as habitações, abatendo todo o tipo de animais domésticos e aprisionando doentes e idosos que não puderam fugir. Três pessoas foram assassinadas a tiro”.
Os militares regressariam a essa aldeia a 6 de maio, incendiando 22 casas e destruindo as colheitas. Milhares de Bayingyis tornaram-se refugiados, encontrando-se agora distribuídos por aldeias vizinhas ou nos complexos das organizações religiosas ligada à Diocese de Mandalay. Muitos viram-se obrigados a abandonar tudo e a fugir, porque nos episódios anteriores houve vários casos de assassinato precedidos por atos de tortura. Numa altura em que se agudiza a perseguição que lhes é movida pelos militares, à comunidade bayingyi nada mais resta do que aguardar que o país dos seus antepassados venha em seu socorro. Urge uma campanha de angariação que lhes possa fazer chegar alimentos, medicamentos, apoio financeiro e moral, algo de fundamental para quem tudo perdeu e não sabe o que os espera nos próximos meses. Apelamos a todos aqueles com capacidade para influenciar entidades públicas, nacionais e internacionais, a desenvolver ações para que esta tentativa de genocídio étnico-cultural seja travado o quanto antes. Portugal tem permanecido na memória coletiva dos bayingyis como um país quase mítico, terra dos seus antepassados, e Portugal tem agora a oportunidade de se afirmar como uma entidade presente, mais próxima. Essa é a sua obrigação histórica. Joaquim Magalhães de Castro têm sugerido várias soluções para futuramente ajudar os bayingyis:
– Atribuição de nacionalidade portuguesa através de uma lei similar à aplicada aos sefarditas de origem portuguesa.
– Atribuição de bolsas de estudo que permitam a alguns dos jovens bayingyis estudar em Portugal, porque eles têm, de facto, um amor muito grande ao nosso país.
Recordemos nesta hora uma canção que muito ajudou numa causa semelhante:
Ai Timor
Calam-se as vozes
Dos teus avós
Ai Timor
Se outros calam
Cantemos nós