Bárbara Gil

Bárbara Gil nasceu no Funchal, Ilha da Madeira em 1978. Vive e trabalha em Lisboa. Estudou Design na UMA /IADE e Pintura na National Academy Of Fine Arts – Nova York, no Academic Atelier de Sam Adoquei e na Art Student’s League – Nova York, bem como no Central Saint Martin’s College of Art – Londres. Em 2015 foi um dos 8 artistas selecionados pelo artista de rua de renome internacional VHILS a.k.a Alexandre Farto, para um workshop criativo que decorreu no Instituto Restart em Lisboa. Em 2015 foi vencedora da primeira edição do Concurso Urbart na Ilha da Madeira, concurso mural promovido pela Câmara Municipal do Funchal tornando-se na primeira artista a pintar um mural de grande dimensão na ilha.

Como nasceu a paixão pela pintura?

Desde que me lembro de existir , pintar e desenhar eram as minhas atividades preferidas. Desde o infantário, depois na primária, também os educadores e professores destacavam o meu gosto e habilidade. Venho além disso de uma família de artistas. Alguns profissionais como o meu tio bisavô Amadeo Pestana, músico de jazz com alguma projeção, o meu próprio bisavô que ainda conheci também músico amador e profissionalmente uma espécie de designer de lettering da época onde tudo era feito à mão. Fora toda uma estirpe de avós e bisavós, desenhadoras de estampas de bordados, picotadeiras e bordadeiras, que não só tive a sorte de conviver como muito provavelmente herdar alguma destreza manual.

Apesar da sua formação clássica tem vindo a diversificar o seu trabalho cortando com algumas correntes mais conservadoras. É propositado esse jogo do tradicional com o modernismo?

Sim, penso que essa mistura entre tradição e contemporâneo é algo que me define em todas as áreas da minha vida. É preciso saber as regras para depois saber quando e como quebrá-las. Respeitar a história conhecê-la inspirar-se e a partir daí também inovar. Trazer leveza ao passado.

Como é o seu processo de trabalho?

O meu processo de trabalho é em parte intuitivo e passa pelo consumo de muita informação visual e não só. Desde moda, design a arquitetura, como também de cultura Pop e história.
As viagens e as cidades são também um alimento muito importante que vou fotografando e armazenando.
Depois tudo isso é de alguma forma processado cá dentro e começam a surgir imagens que representam as sensações e mensagens que quero transmitir.
Em termos mais práticos antes de começar uma peça há uma pesquisa de imagens porque como trabalho com figurativo e não tenho modelo, preciso de encontrar proporções e depois há uma espécie de um Photoshop mental onde elementos são acrescentados e outros eliminados até encontrar o equilíbrio e a mensagem que procuro.
Mas na verdade quando olho para o papel e a tela em branco a imagem já está dentro da minha cabeça. Não faço esboços, apenas um desenho rápido para me guiar em escala e pinto “alla prima”. Depois de começar são momentos de grande foco e concentração que me consomem completamente, até fisicamente. E é difícil quebrar e voltar à vida normal. Talvez por isso em alguns casos não consiga ser tão rápida como gostaria. Especialmente quando me deparo com algum desafio em termos de composição ou com algum detalhe que não funciona .
Por precisar desse foco, os finais do dia e as noites são sem dúvida os períodos que sinto mais adequados, a produtividade sem distrações e interrupções. O entrar e sair daquilo que chamam “the zone”, comum aos programadores por exemplo, e aos atletas é para mim doloroso e difícil.

O cinema aparece muito representado nas suas obras. É apenas circunstancial ou realmente é uma fonte de inspiração?

Sim o cinema é sem dúvida uma fonte de inspiração e faz parte desse alimento visual que necessito. As vezes pode ser uma forma de desligar e descansar mentalmente.
É complicado quando tudo aquilo que as pessoas usam como lazer para um criativo é uma sugestão. Por vezes há uma sobre-estimulação. Mas algum cinema talvez consiga combinar a inspiração e a descontração. Além disso sendo natural de uma ilha e sem dúvida uma janela para o mundo.

O que a seduz na arte de rua?

Na arte de rua seduz-me a espontaneidade mas sobretudo a democratização da arte e a aproximação às pessoas que de outra forma estariam distantes desse mundo. Seja pelo contexto das suas vidas, seja por uma certa intimidação que os ambientes puramente vocacionados e direcionados à arte por vezes mesmo que inadvertidamente podem causar.

Tem sido convidada para vários festivais e residências internacionais, com destaque para o SICF (Spiral creator’s Festival em Tokyo), entre outros. Qual a importância destas presenças internacionais para a sua carreira?

As presenças internacionais são importantes na medida em que me põem em contacto com um público mais abrangente ao mesmo tempo que me expõe a diferentes culturas e hábitos que vão-me moldando pessoalmente e profissionalmente. São mundos que vão contaminando a minha forma de estar e pensar, da melhor forma possível. Alargando horizontes, ideias, empatia e tolerância.

Quais foram as principais influências que marcaram o seu percurso de artista plástica?

A pessoa que sem dúvida mudou a minha vida foi o meu professor mentor e amigo Sam Adoquei . É por isso uma grande influência.
Na história da arte os clássicos – caravaggio , velasquez, a escola holandesa e mais tarde impressionistas e sem dúvida os expressionistas da escola americana, Pollock, Krasner, de Kooning, Calder. Inclusivamente a minha escolha de escolas nos Estados Unidos teve essa influência porque escolhi as mesmas instituições onde se formaram e deram aulas e que continuam a seguir os mesmos métodos, como a art students league e a National academy of Fine arts.

É possível viver só da pintura?

Sim é possível. E é possível viver bem da pintura mesmo em Portugal.
Mas é necessário um sentido prático e a consciência que a pintura ou qualquer atividade criativa, pode ser um dom mas para fazer-se vida desse dom tem que ser encarada como uma profissão como outra qualquer. E isso implica alguma disciplina e por vezes algumas cedências no caso das comissões. Assim como muitos sacrifícios e uma capacidade grande de lidar com a incerteza financeira sem deixar-se abalar. Implica também uma estrutura dentro da liberdade.
Infelizmente é uma visão que me parece que as escolas de arte em Portugal não transmitem e deixam muitos alunos talentosos em choque com a realidade sem qualquer tipo de ferramentas ou armadura, para lidar com os aspetos práticos da vida ou como fazer do seu dom uma profissão ou um ganha pão.
Fora todo um discurso de subsídio-dependência a fundo perdido e um ressabiamento aos que quebram a bolha e alcançam sucesso a escala mundial, como felizmente já vamos tendo exemplos.
Mas é triste que em vez dessas pessoas serem celebradas cá dentro ao nível do que se faz com jogadores de futebol por exemplo, sejam constantemente alvo de críticas ou de desdém e sobranceria.

Se tivesse que referenciar uma obra sua, qual escolheria? Porquê?

É muito difícil. Não consigo porque sinto que ainda estou em construção e que a minha grande obra é a próxima. Mas talvez a que seja referência para a maior parte das pessoas pela escala e visibilidade seja o meu mural “Zapruder”.

Projetos para 2024?

Os meus projetos para 2024 são colocar as minhas encomendas em dia depois de alguns desafios de saúde e mais uma exposição no final do ano na Galeria de São Mamede em Lisboa.

Uma mensagem para todos os artistas do mundo.

Consistência e um ditado que o Sam usa muito “toda a gente quer chegar ao topo mas ninguém quer subir os degraus”. Subam os degraus!


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