O direito a um ambiente limpo
O direito a um meio ambiente seguro, limpo, saudável e sustentável, passou a ser um direito humano fundamental. Esta decisão resultou de uma resolução do Conselho dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), tomada a 7 de Outubro do corrente ano. Apesar de não ter caracter vinculativo, esta tomada de posição funciona como um mecanismo de apoio na defesa dos direitos humanos e do meio ambiente. Uma decisão histórica recebida com aplausos, que tardou, mas acabou por acontecer.
Esta decisão reveste-se ainda de um maior significado por ter sido tomada pouco tempo antes da Conferência de Mudanças Climáticas da ONU, em Glasgow, na Escócia, com início a 31 de Outubro e término a 12 de Novembro.
A ONU quis assim dar um sinal para as populações e grupos ambientalistas de que não estão sozinhos na defesa e protecção do meio ambiente, responsabilizando, por outro lado, os governos, para que tomem medidas concretas nesse sentido.
A resolução supra citada destaca que “a degradação ambiental, as mudanças climáticas e o desenvolvimento insustentável são algumas das mais sérias ameaças à capacidade das gerações presentes e futuras de usufruir dos direitos humanos, incluindo o direito à vida“. Além disso, estabelece que os governos dos diversos países membros da ONU “têm a obrigação de respeitar, proteger e promover os direitos humanos, inclusive em todas as acções empreendidas para enfrentar os desafios ambientais, e de tomar medidas para proteger os direitos de todos“. Após esta decisão, os governos são obrigados a adoptar “medidas adicionais” para protegerem todos aqueles que são “particularmente vulneráveis aos danos ambientais”.
Todavia, se só agora a ONU decidiu nesse sentido, no caso de Portugal, esse direito já estava inscrito na Constituição da República, consagrado no artigo art.º 66.º, que refere o seguinte:
“1. Todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender.
2. Para assegurar o direito ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e com o envolvimento e a participação dos cidadãos:
a) Prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão;
b) Ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma correcta localização das actividades, um equilibrado desenvolvimento sócio-económico e a valorização da paisagem;
c) Criar e desenvolver reservas e parques naturais e de recreio, bem como classificar e proteger paisagens e sítios, de modo a garantir a conservação da natureza e a preservação de valores culturais de interesse histórico ou artístico;
d) Promover o aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e a estabilidade ecológica, com respeito pelo princípio da solidariedade entre gerações;
e) Promover, em colaboração com as autarquias locais, a qualidade ambiental das povoações e da vida urbana, designadamente no plano arquitectónico e da protecção das zonas históricas;
f) Promover a integração de objectivos ambientais nas várias políticas de âmbito sectorial;
g) Promover a educação ambiental e o respeito pelos valores do ambiente;
h) Assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com protecção do ambiente e qualidade de vida”
Se a Constituição da República Portuguesa e outros instrumentos legais, nomeadamente, a Lei de Bases da Política do Ambiente (artigos 5.º, 6.º, 7.º e 8.º) e o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (art.º 191), consagram esse direito, por que motivo o Governo português prossegue com as suas políticas anti ambientais? Os exemplos são vários, desde o tratamento de resíduos, até às autorizações de projectos relacionados com monoculturas (eucaliptos, abacates), painéis solares, mineração (lítio e outros minerais), parques eólicos, entre outros. E, se o Governo, demitindo-se das suas responsabilidades, não tem ocupado o lugar que lhe compete na defesa de um ambiente seguro, limpo, saudável e sustentável, a quem cabe essa função? Aos cidadãos e organizações ambientalistas, a quem não resta outro caminho senão tomarem as rédeas dessa mesma defesa. É a única forma de verem os seus direitos salvaguardados!
Não deixa de ser curioso, o seguinte: alguns dos maiores danos ambientais têm sido provocados a coberto da implementação de modelos de desenvolvimento relacionados com as ditas energias limpas!
Porque é importante manter um meio ambiente limpo, sustentável e saudável? Várias são as razões que o justificam. Todos sabemos que a poluição do ar, da terra e das águas, reduz a qualidade da saúde das pessoas e reduz a expectativa de vida.
A protecção do meio ambiente é um escudo protector das alterações climáticas, que incrementam riscos adicionais à segurança e à saúde das populações. Por outro lado, a preservação da biodiversidade é muito importante para manter a qualidade e o valor nutricional dos alimentos.
Segundo o relatório “UN Special Rapporteur on human rights and the environment” elaborado por David R. Boyd, em 2018, a cada quatro segundos há uma vida humana a terminar, de forma prematura, porque foi exposta a poluição e outros danos ambientais. Urge alterar esta situação dramática.
Em jeito de conclusão, esperamos que esta resolução da ONU não seja mais uma norma para fechar a sete chaves no baú do esquecimento. Não é por falta de instrumentos jurídicos que a qualidade do meio ambiente não tem sido preservada. Falta a sua aplicação prática!