Philippe Fernandes
Presidente da Associação Internacional dos Lusodescendentes
Philippe Fernandes, fundador e Presidente da Associação Internacional dos Lusodescendentes (AILD), é a força motriz por trás de uma organização que, em apenas cinco anos, se tornou referência para as comunidades portuguesas no estrangeiro. Em entrevista à Revista Descendências , partilha o percurso transformador da AILD, nascida de um sonho coletivo e de um momento profundamente pessoal. Inspirado pela determinação de quem atravessou fronteiras em busca de um futuro melhor, Philippe Fernandes reflete sobre o impacto da associação na preservação da identidade cultural, na promoção da língua portuguesa e na criação de redes de apoio global. Com um olhar no futuro, destaca ainda os desafios e as ambições que continuarão a unir lusodescendentes e a reforçar os laços com Portugal.
Como surgiu a ideia de criar a Associação Internacional dos Lusodescendentes (AILD)?
Surgiu da vontade de seis fundadores: Cristina Passas, Gilda Pereira, Madalena Pires de Lima, Jorge Vilela, José Governo e eu próprio. Foi o resultado natural das nossas vivências e experiências, pois, de uma forma ou de outra, todos somos fruto da comunidade portuguesa que vive fora do seu País.
A AILD foi criada num dia de inverno cinzento, frio e chuvoso, mais precisamente no dia 19 de dezembro de 2019. Estiveram presentes no ato jurídico a Gilda Pereira e eu, assistidos por uma advogada francesa e portuguesa, Sandrine Bisson.
Esse dia teve uma carga emocional muito profunda, pois era o aniversário do falecimento da minha mãe. Criar a AILD foi uma forma de a homenagear. De certa forma, ela esteve presente. Curiosamente, a Gilda tem uma fisionomia que lembra muito a minha mãe em jovem, o que reforçou ainda mais essa sensação.
A minha mãe foi para França muito jovem, foi de “assalto” como tantos outros portugueses. Por lá viveu, formou família, trabalhou e foi muita ativa nas organizações ligadas aos portugueses. Sempre procurei que a AILD incorporasse muitas das suas características. Por isso, a AILD tem sempre as portas escancaradas. Há sempre lugar para mais um à mesa. Queremos agregar todos, todas as pessoas e organizações de todas as comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, independentemente das suas crenças políticas, convicções pessoais ou religião. A nossa visão é formar uma grande família.
Também pretendemos homenagear os nossos pais, que tiveram a coragem de sair de Portugal em busca de um futuro melhor, enfrentando barreiras e sacrificando-se para que a sua descendência tivesse uma vida melhor. É nossa obrigação dar voz e unir a comunidade portuguesa dispersa pelo mundo.
A AILD procura, assim, promover as raízes culturais, a língua e o património lusófono, ao mesmo tempo que cria uma rede de apoio e valorização dos lusodescendentes. Os fundadores da AILD não encontrando nenhuma associação com este espírito, decidiram criar uma instituição que representasse os interesses dos lusodescendentes, enfrentado desafios específicos como a integração em países estrangeiros, o acesso a oportunidades educacionais e a preservação da herança cultural portuguesa.
Queremos fortalecer os laços com Portugal e abrir portas para que as novas gerações redescubram e celebrem a sua identidade. Para além disso, promovemos o diálogo cultural com as nações de acolhimento, incentivando uma coexistência rica e harmoniosa.
Foi eleito presidente da AILD por unanimidade aquando da sua fundação. Essa confiança da Direção foi importante para aceitar o desafio de conduzir os destinos do novo projeto associativo?
Não foi isso que fez aceitar o desafio. Entre os fundadores houve sempre uma grande sintonia, confiança e consenso, tem sido sempre muito fácil chegar a posições unanimes entre nós. Qualquer um de nós poderia ter sido designado presidente. Éramos seis, e somente um podia assumir o cargo. Todos tínhamos o mesmo espírito de serviço para uma causa maior.
Nunca tinha sequer ponderado essa possibilidade, mas aceitei por espírito de serviço.
O destino da AILD e dos seus projetos está na mão de cada um dos seus membros. A direção apenas tenta criar as condições para que todos os membros possam levar longe, muito longe o destino da AILD.
Assumir um cargo diretivo é uma grande responsabilidade e um desafio enorme para manter a equipa alinhada com o espírito da AILD, coesa e motivada. É também uma responsabilidade ser a face visível de tantos associados dedicados, que muitas vezes realizam um trabalho mais extraordinária do que o presidente. A todos esses presto a minha homenagem e gratidão, que me deu alento para os imitar.
Concordo consigo: este projeto associativo é novo, e tudo faremos para que seja sempre novo e que continue a impactar positivamente as comunidades Portuguesas.
A AILD cresceu bastante desde a sua fundação. Quais são as principais atividades da associação hoje?
O crescimento da associação é o reflexo da generosidade de tantos membros e simpatizantes que se identificam com os valores da AILD. Atualmente, a AILD concentra-se em diversas atividades, como eventos culturais, apoio a projetos educativos, e iniciativas que promovem o empreendedorismo entre os lusodescendentes. A associação também organiza encontros e conferências que aproximam as comunidades espalhadas pelo mundo, fortalecendo laços e promovendo colaborações, criando e incentivando redes de contacto entre lusodescendentes e instituições de todo o mundo.
Outro destaque é o trabalho na área da língua portuguesa, essencial para preservar a identidade cultural. Aliás, brevemente, teremos novidades surpreendentes relacionadas com a língua portuguesa. Procuramos impactar profundamente a manutenção e aprofundamento das raízes culturais portuguesas, a preservação da maneira de ser portuguesa e incentivando parcerias pública e privadas para apoiar os lusodescendentes em diversas áreas. Um exemplo é a IIIª Edição do Concurso Literário “As Minhas Férias” cujo destino será Angola. Aliás, convido os leitores a descobri-lo.
A revista Descendências Magazine é uma das iniciativas de destaque da AILD. Qual é o objetivo desta publicação?
A Descendências Magazine é muito mais do que uma publicação; é uma ponte entre lusodescendentes e as suas raízes, entre as várias comunidades portuguesas, entre Portugal e as comunidades portuguesas no exterior. O seu objetivo é celebrar e promover histórias de sucesso, tradições, e desafios da comunidade portuguesa. É um espaço onde a comunidade pode partilhar as suas experiências, aprender uns com os outros reforçando os laços culturais.
A Descendências Magazine incorpora de uma forma visível o espírito da AILD. Quem nos quiser conhecer, basta ler a nossa revista. É portanto o nosso cartão-de-visita, o hall de entrada para esta maravilhosa comunidade. Posso testemunhar que ninguém fica indiferente ao lê-la, especialmente ao ter a edição impressa nas mãos.
Além disso, a revista destaca a importância de se preservar e expandir o uso da língua portuguesa, valorizando o papel das comunidades portuguesas no mundo. É uma plataforma que apoia novos talentos, dando visibilidade a artistas, escritores e empreendedores lusodescendentes.
A Descendências Magazine é a melhor forma de apresentar o espírito da AILD. É um desafio mensal tornado possível, mês após mês, ano após ano, graças à generosidade de membros, parceiros, pessoas de boa vontade, e sobretudo ao extraordinário esforço do Jorge Vilela, cuja dedicação exemplar não se reduz unicamente na criação da Descendências Magazine. Na verdade, deveria sim prestar homenagem à Fátima Magalhães que permite ao Jorge ser o nosso Jorge.
Olhando para o futuro, quais são os próximos passos da AILD?
Os próximos passos da AILD incluem a expansão das suas atividades, tanto em termos de alcance geográfico quanto na diversidade de projetos. A associação pretende estabelecer parcerias mais fortes com entidades portuguesas e internacionais, promovendo a educação, a inovação e o empreendedorismo entre os lusodescendentes. Para tal, a AILD mantém o foco no aumento do número de membros, o que permitirá concretizar esses objetivos.
Outro foco será o desenvolvimento de programas específicos para jovens, incentivando-os a redescobrir as suas raízes e a construir pontes com Portugal. Projetos relacionados com a sustentabilidade e a inovação tecnológica também integram a visão futura da associação.
A AILD tem planos ambiciosos para o futuro, continuando com o processo de internacionalização. Pretende estabelecer novas delegações em diversos países, replicando a sua estrutura e missão, de forma a estar mais próxima das comunidades lusodescendentes espalhadas pelo mundo. Além disso, continuará a desenvolver projetos que promovam a língua e cultura portuguesas, fortalecendo os laços entre os lusodescendentes e Portugal.
A AILD tem desempenhado um papel fundamental em diversas áreas. Quais são os projetos mais importantes que a associação promove atualmente?
Os projetos mais importantes incluem a Descendências Magazine, Portuguese in Translation Book Club, o Projeto Realces e iniciativas de preservação da língua portuguesa, e programas educativos voltados para jovens. A AILD também organiza eventos que celebram datas importantes para a comunidade lusófona, fortalecendo o sentimento de pertença.
Adicionalmente, promove ações de networking entre empresários e profissionais lusodescendentes, criando um ecossistema de oportunidades e colaboração.
Entre os projetos de destaque da AILD estão a promoção do acesso ao ensino superior em Portugal para lusodescendentes, através de programas como o “Estudar e Investigar em Portugal”, que disponibiliza vagas específicas para estes estudantes. A associação também organiza exposições itinerantes, como o projeto “Obras de Capa”, que promove artistas plásticos e escritores lusófonos em diversos países.
Como presidente da AILD, quais são os maiores desafios que tem enfrentado na liderança da associação?
Um dos maiores desafios é a dispersão geográfica dos membros, o que exige uma abordagem digital forte e eficiente, especialmente no que toca à coordenação de atividades e comunicação eficaz. Além disso, é preciso manter a motivação e o envolvimento da equipa, especialmente numa associação voluntária. Outro desafio é garantir financiamento suficiente para os projetos, enfrentando muitas vezes limitações de recursos. Outro ponto é o estabelecimento de contacto com outros lusodescendentes que ainda não se juntaram à AILD, muitas vezes por falta de conhecimento sobre a nossa existência. A liderança requer equilíbrio entre manter a missão original da AILD e adaptar-se às necessidades emergentes da comunidade e dos seus membros. Não têm sido fácil encontrar a melhor roupagem jurídica para suster a realidade jurídica de cada delegação por esse mundo fora. Cada país tem as suas especificidades, que põe em causa o nosso desejo para que a AILD deva ter uma estrutura simples e ágil. Caso contrário, o nosso tempo e recursos serão consumidos pela burocracia de manter a organização no seu todo, em vez de concentrarmo-nos no que realmente importa: realização de eventos e projetos desejados pelos associados e comunidades onde estamos presentes.
Aliás, temos contactado entidades semelhantes para compreender como elas lidam com esta problemática, mas ainda não encontramos uma solução satisfatória, que tem até refreado a criação de delegações em certos países, pois não queremos contribuir para o aparecimento de uma estrutura jurídica colossal.
Durante a pandemia de COVID-19, a AILD tomou uma posição ativa. Como foi esse processo e que ações foram implementadas?
A pandemia obrigou a AILD a reinventar-se, apostando em eventos online e reforçando a comunicação digital. Foram realizadas conferências virtuais, workshops e outras iniciativas que permitiram manter a proximidade com os membros e continuar a promover a cultura portuguesa, mesmo à distância. Neste período fomentámos a criatividade para mantermos a nossa atividade, para fazermos face às contrariedades originadas pela COVID e canalizámos os contributos dos membros para sugerir ao governo formas de mitigar os efeitos da crise.
Por exemplo, em Portugal, contribuímos para difundir as recomendações das autoridades de saúde e apresentámos sugestões ao governo baseadas nas experiências dos nossos associados espalhados pelo mundo.
Com o primeiro mandato da AILD a terminar, e olhando para o percurso feito até aqui, como consegue posicionar a AILD daqui a 5 anos, ou seja, projetando o final do segundo mandato que inicia em 2025?
A melhor pessoa para responder à sua pergunta seria a nossa atual presidente, Cristina Passas, que traz consigo uma presença extraordinária.
Consigo, no entanto, imaginar que, daqui a cinco anos, a AILD poderá ser vista como uma referência global para os lusodescendentes, ligando ainda mais pessoas de todas as sensibilidades e multiplicando os seus projetos de impacto. A visão inclui um maior envolvimento das novas gerações, uma maior representação política e social, e a concretização de um fundo de apoio financiado por fundos públicos, comunitários e privados que financiem projetos próprios e de outras associações. Serão projetos de mérito e com relevância para as comunidades portuguesas. Que a nossa atuação tenha motivado milhares de lusodescendentes a obterem a sua nacionalidade portuguesa, o seu cartão de cidadão, e que, exercendo as suas duas nacionalidades, enriqueçam a sua existência. Não há nada melhor do que “respirar com dois pulmões”…
Espera-se que a associação seja uma voz ativa na preservação da cultura e do património português a nível internacional. Que, pelo nosso exemplo, cada associação deixe de trabalhar de forma isolada e passe a cooperar, em rede com todas as outras.
Temos milhares de associações espalhadas pelo mundo, e, se partilhassem meios e cooperassem mais entre si, a atuação de cada uma delas poderia atingir patamares impressionantes. Neste momento, temos inúmeras “capelinhas” pelo mundo fora, quando poderíamos ter uma catedral maior que a Catedral de Paris, para benefício de todos.
Daqui a cinco anos, a AILD ambiciona ser uma referência internacional na promoção da cultura e língua portuguesas, com delegações ativas em diversos países e uma rede sólida de parceiros. Pretende também ter um portefólio diversificado de projetos que beneficiem as comunidades lusodescendentes e reforcem os laços com Portugal.
O que distingue a AILD das demais associações, quer em termos de organização estrutural, quer em termos do seu funcionamento?
A AILD diferencia-se pelo seu caráter agregador e colaborativo, procurando manter-se neutra politicamente, mas incentivando os seus membros a terem convicções fortes e a exercerem plenamente todos os direitos e obrigações resultantes das suas cidadanias, impactando politicamente as sociedades em que estão inseridos.
Este caráter agregador e colaborativo leva-nos a privilegiar as parcerias. Apenas promoveremos ações de forma isolada quando não é possível realizá-las em conjunto com outras entidades.
A AILD procura ser a casa de todos, acolhendo a diversidade dos lusodescendentes e superando o espírito de “a minha capelinha” ou de divisões entre fações. Pretendemos que cada membro incorpore a maneira de ser português, o espírito português, e de serem cidadãos do mundo, impactando positivamente as sociedades em que vivem.
O nosso espírito leva-nos a celebrar o sucesso dos outros, desejando colaborar para que esse sucesso seja ainda maior.
Queremos contribuir eliminar a divisão entre “os de cá e os de lá”, promovendo a igualdade de representação na Assembleia da República, por exemplo. Aspiramos a que deixe de haver “as comunidades portuguesas”, para haver uma única “comunidade portuguesa”, que inclua tanto os residentes em Portugal como os que vivem no estrangeiro. Tenho a convicção muito pessoal de que foi este espírito de separação entre “os de cá e lá” que contribuiu para a independência do Brasil.
A nossa atuação não se limita aos lusodescendentes, mas estende-se também às comunidades que nos são próximas. Com as comunidades com as quais partilhamos uma história, uma língua, promovendo tudo o que possa enriquecer ambas as comunidades e incentivando um diálogo intercultural profundo.
Procuramos acompanhar a evolução dos tempos e, por isso, o nosso logótipo também evoluiu. Não estamos presos ao passado, ao que fizemos; abraçamos o futuro.
A AILD destaca-se ainda pela sua estrutura internacional, que procura recentrar a atenção da comunidade portuguesa para Portugal. Por essa razão, a sede está localizada em Lisboa, capital dos portugueses, enquanto desenvolvemos delegações em todos os países onde a comunidade portuguesa está presente.
Gostaria de aproveitar para agradecer ao Centro de Escritórios Latino Coelho, que acolhe organizações internacionais e nacionais. Desde o primeiro momento, acolheram-nos de forma gratuita, e estamos profundamente gratos por esse apoio.
Falou na importância dos parceiros e da cooperação enquanto fator diferenciador da AILD. Considera que ao longo do tempo os parceiros, a credibilidade, a colaboração tem vindo a aumentar, facilitando a ação da AILD?
No início, enfrentámos imensas dificuldades devido à nossa “juventude”, mas, ao longo do tempo, a AILD conseguiu fortalecer as suas parcerias, algo que tem sido crucial para a expansão das suas atividades. Desde colaborações com câmaras municipais em Portugal até parcerias com organizações internacionais, esta rede de aliados proporciona recursos e visibilidade à associação. O tempo tem sido o nosso importante aliado, ajudando-nos a quebrar desconfianças, preconceitos e o desconhecimento. O tempo tem revelado que a AILD não é um projeto pessoal de um indivíduo, não é uma “capelinha” privada, nem um projeto de uma fação política ou de um iluminado com uma agenda sectária.
O crescimento do número de membros e de parceiros, institucionais ou não, reflete a credibilidade construída ao longo dos anos, resultado de projetos bem-sucedidos, do mérito das iniciativas e da transparência com que a AILD opera.
A confiança dos parceiros permitiu não só diversificar as iniciativas, mas também ampliar o alcance da associação, beneficiando um número crescente de lusodescendentes.
Estou convencido de que os nossos parceiros se sentem em sua casa quando colaboram connosco.
Como foi gerir uma associação com esta especificidade dos seus membros estarem todos geograficamente dispersos, onde o digital tem sido o grande instrumento de comunicação? Tinha algum núcleo duro que lhe permitisse ser o motor para o resto da AILD?
Gerir uma associação com membros espalhados pelo mundo foi um desafio que a AILD enfrentou de forma inovadora. O recurso às plataformas digitais tornou-se essencial para unir vozes de diferentes continentes, criar diálogos e promover eventos inclusivos. O recurso aos meios tecnológicos permite quebrar as barreiras geográficas e do tempo.
Dêmos o exemplo, realizando as eleições dos novos corpos sociais através do voto eletrónico, que permitiu a participação de todos e saber o resultado das eleições de forma instantânea. A relação de confiança, o espírito de serviço, a dedicação e a generosidade dos membros foram fundamentais. Esses valores garantiram o aparecimento de membros mais ativos e alinhados com a visão da associação, que funcionaram como motor para inspirar outros voluntários e assegurar que os projetos avançassem com eficiência.
Lembro-me do momento em que tudo começou com apenas seis fundadores. Não tínhamos meios, nem apoios, apenas uma enorme vontade de criar algo relevante. Olhando para trás, vejo o quanto fomos verdadeiros loucos por acreditar no que hoje se tornou uma realidade. Valeu a pena a loucura.
Olhando para o trabalho desenvolvido pela AILD ao longo destes cinco anos, em termos de financiamento, como é que a AILD sobrevive? Que apoios tiveram? Receberam financiamento do Estado Português?
A sobrevivência da AILD deve-se a um esforço constante de angariação de fundos, seja através de parcerias, eventos ou doações. O apoio financeiro de entidades públicas tem sido pontual e muito reduzido. Assim, a associação tem procurado diversificar as suas fontes de financiamento, incluindo colaborações com empresas privadas e organizações internacionais. Uma grande parte do financiamento é assegurada pelos membros da AILD, com especial destaque para as contribuições dos fundadores e das suas empresas.
Felizmente, temos também contado com apoios não financeiros, igualmente importantes, que nos permitiram concretizar vários objetivos. Somos gratos pelos atos de generosidade dos membros, simpatizantes, empresas e instituições privadas e públicas, que revendo-se no nosso projeto não deixaram de dar o seu precioso contributo. Existem muitas formas de ajudar.
Comparando com outras iniciativas que recebem financiamento público, é incompreensível como a AILD recebe tão pouco, melhor dizendo, recebe praticamente nada… Apesar disso, maximizamos os recursos e mostramos que a paixão e o compromisso são tão importantes quanto o orçamento. Sentimo-nos sensibilizados pela generosidade dos nossos membros e simpatizantes, que continuam a apoiar-nos.
Que balanço faz deste primeiro mandato à frente da liderança da AILD? Voltaria a fazer tudo igual?
O balanço é extremamente positivo. Durante este primeiro mandato, alcançamos muitos marcos importantes, desde o crescimento da rede de membros até à realização de projetos de grande impacto. Claro que, olhando para trás, há sempre lições a aprender, mas cada desafio superado reforçou a missão e a visão da AILD.
Voltaria a fazer tudo com a mesma generosidade, a trilhar o mesmo caminho, mas com a sabedoria acumulada para tornar os processos mais eficientes e amplificar os resultados. Teria convidado muito mais cedo membros que tiveram um impacto tão grande no que a AILD se tornou…
E, certamente, teria preparado melhor esta entrevista.
Tem neste momento ideia do impacto e do sentimento dos lusodescendentes e das comunidades portuguesas em geral a residirem lá fora, pela criação, existência e ação de uma associação que nasceu com esta preocupação pelas comunidades portuguesas, pelo apoio, pelo promoção e pela sua valorização? O feedback das comunidades tem sido extremamente encorajador. Muitos lusodescendentes sentem que finalmente têm uma voz e uma plataforma que os representa. Há um sentido de orgulho e pertença renovado, com muitos a redescobrir as suas raízes e a contribuir para o fortalecimento da cultura portuguesa no mundo.
O impacto não é apenas cultural, mas também social e económico, com oportunidades de networking, projetos de empreendedorismo e programas educativos que criam valor tangível para as comunidades. Tentaremos complementar projetos já existentes e colmatar carências crónicas.
Reconforta ver o número de associados em crescimento e o interesse em pagar as quotas da AILD, os donativos têm aumentado… algo que tem impactado positivamente a nossa capacidade em nos organizar e a promover eventos.
Destaco aqui o trabalho de uma vida do nosso membro destacado Joaquim Magalhães de Castro, que dá voz a comunidades esquecidas por Portugal e que ficaram a sua sorte, algumas comunidades são atualmente perseguidas, pelos simples factos de serem descendentes de portugueses e por viverem ainda a sua fé católica. Infelizmente, os partidos políticos e os jornalistas não se interessam por esta causa. Timor foi um milagre neste panorama. Ele destaca situações como a da comunidade lusodescendente do Myanmar, com mais de 450 anos de existência, conhecida localmente como Bayingyi e resultante da miscigenação de aventureiros e comerciantes portugueses com mulheres locais, vive um momento muito difícil. Na sequência da onda de violência que varre o Mynamar há quase dois anos, várias das aldeias bayingyis foram inteiramente queimadas, os bens das pessoas destruídos e houve até vários assassinatos. Aterrorizados pela ação da soldadesca e os tiros da artilharia, os habitantes dessas aldeias fugiram e encontram-se agora refugiados nas instalações da diocese em Mandalay, a segunda cidade do país. Como nos podemos interessar por comunidades que não tem nenhuma ligação a nós e deixar estas voltadas ao esquecimento?
Sendo a AILD uma estrutura associativa, de cariz voluntária e sem fins lucrativos, como foi conciliar a AILD e a sua intensa atividade profissional? Ficou alguma coisa para trás?
Conciliar a liderança da AILD com uma vida profissional intensa foi um exercício de equilíbrio e gestão de prioridades. Sem dúvida, exigiu sacrifícios, mas a paixão pela missão da associação tornou esses esforços recompensadores.
Embora tenha havido momentos de dificuldade, o apoio de uma equipa comprometida ajudou a manter o ritmo e a garantir que nada essencial ficasse por fazer.
Esta dificuldade é vivida por todos os membros da AILD, todos têm uma vida profissional intensa. Esta situação podia ser facilitada, caso a AILD tivesse uma estrutura profissional mínima, que ajudaria a concentrar a disponibilidade dos membros nos eventos da AILD e não a gerir burocracia associada aos eventos. Esperámos que 2025 nos traga este apoio administrativo para fazermos cada vez mais.
A participação e as dinâmicas associativas são sem dúvida de extrema importância para a sociedade. Que mensagem gostaria de deixar para um estímulo à participação?
Gostaria de ver mais estudantes universitários envolvidos na AILD, a assumindo iniciativas e liderando eventos. A participação em associações como a nossa é uma forma de contribuir para algo maior, de fazer parte de uma comunidade que valoriza as suas raízes e constrói um futuro melhor. Cada pessoa pode fazer a diferença, seja através de pequenas ações ou de um envolvimento mais ativo.
Juntos, podemos construir uma “catedral”, a nossa Sagrada Família, uma instituição que beneficia todos. A mensagem é clara: a herança cultural portuguesa, a maneira de ser português é um tesouro que deve ser preservado e celebrado, e isso só é possível com união e participação ativa. Participar é não só um dever, mas também uma oportunidade de crescimento pessoal e coletivo.
Saiam de Portugal, porque somente quem vive fora se apercebe como o nosso país é verdadeiramente único. Devemos todos empenhar-nos para que Portugal continue a ser esse lugar especial.