Poesia – Alberto Caeiro

No Entardecer dos Dias de Verão


No entardecer dos dias de Verão, às vezes,
Ainda que não haja brisa nenhuma, parece
Que passa, um momento, uma leve brisa…
Mas as árvores permanecem imóveis
Em todas as folhas das suas folhas
E os nossos sentidos tiveram uma ilusão,
Tiveram a ilusão do que lhes agradaria…
Ah, os sentidos, os doentes que vêem e ouvem!
Fôssemos nós como devíamos ser
E não haveria em nós necessidade de ilusão …
Bastar-nos-ia sentir com clareza e vida
E nem repararmos para que há sentidos …
Mas graças a Deus que há imperfeição no Mundo
Porque a imperfeição é uma cousa,
E haver gente que erra é original,
E haver gente doente torna o Mundo engraçado.
Se não houvesse imperfeição, havia uma cousa a menos,
E deve haver muita cousa
Para termos muito que ver e ouvir …

Alberto Caeiro, in “O Guardador de Rebanhos – Poema XLI”
Heterónimo de Fernando Pessoa

Alberto Caeiro

Alberto Caeiro da Silva foi um heterónimo criado por Fernando Pessoa, sendo considerado o Mestre Ingénuo dos heterónimos Álvaro de Campos e Ricardo Reis e também de seu próprio autor, Fernando Pessoa, apesar de apenas ter feito apenas a instrução primária.

Alberto Caeiro é um poeta voltado para a simplicidade e as coisas puras. Viveu em contacto com a natureza, extraindo dela os valores ingénuos com os quais alimentava a alma. É um poeta bucólico, dá importância às sensações, registando-as sem a mediação do pensamento.

Alberto Caeiro é o lírico que restaura o mundo em ruínas. Para Caeiro, “tudo é como é”, tudo “é assim porque assim é”, o poeta reduz tudo à objetividade, sem qualquer necessidade de pensar. Morreu tuberculoso em 1915.

Esta rubrica pretende dar a conhecer ao mundo o melhor da poesia por diversos autores lusófonos. Os poemas são selecionados por Gilda Pereira, uma fã incondicional de poesia.

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