Portugal dos pequeninos

O meu filho regressou à escola e, logo no primeiro trabalho do ano, pediu-me ajuda: tinha de comparar Portugal com os países vizinhos e apresentar semelhanças e diferenças.
Com a curiosidade típica de criança, começou a disparar perguntas, uma atrás da outra, enquanto tomava notas.
— Papá, Portugal é mais pobre do que a Espanha e a França?
— Sim, é.
— Então os salários cá também são mais baixos?
— São, bastante mais baixos.
— Mas se ganhamos menos, pelo menos pagamos menos impostos, certo?
— Errado. Em Espanha e França paga-se, em média, 20 a 30% menos impostos sobre o mesmo rendimento do que em Portugal.
— Então pelo menos as casas são mais baratas cá?
— Não. Surpreendentemente, em muitas zonas de Portugal, a habitação é mais cara do que em Espanha e, em alguns casos, até do que em França.
— E as rendas? Aqui devem ser mais acessíveis, não?
— Também não. Em várias cidades espanholas e francesas, arrendar uma casa fica mais barato do que em Lisboa ou no Porto.
— E os carros? Aqui custam menos, não?
— Também não. São mais baratos lá do que cá.
— Bom, pelo menos a luz e as compras no supermercado devem ser mais caras por lá.
— Nem por isso. Muitas vezes são iguais, ou até mais caras cá. E não te esqueças: o IVA em Portugal é mais alto.
O meu filho ficou perplexo.
Apontava tudo em silêncio, franzindo o sobrolho, como se estivesse perante um enigma impossível de resolver.
— Então, se os portugueses ganham menos, pagam mais impostos, têm casas e rendas mais caras, carros mais caros, e ainda pagam mais na luz e no supermercado… devem estar sempre em greve, certo?
Sorri com amargura.
— Não, filho. Por incrível que pareça, são os nossos vizinhos que fazem greves mais eficazes, mais organizadas e mais duras.
O olhar dele mudou: incrédulo, como se eu lhe tivesse contado uma piada de mau gosto. Achou que estava a gozar com ele. Irritado, largou o caderno e saiu a correr para falar com a mãe, pensando que estaria a brincar com ele. O que ele não sabe — ainda — é que o salário mínimo em Espanha ronda os 1.400 euros, e em França os 1.800 euros.
Em Portugal, quem recebe 2.000 euros já é tratado como “rico”: paga impostos como se fosse abastado, mas continua sem lugar na creche pública para os filhos, sem acesso fácil à escola que gostaria, nem a uma maternidade ou hospital público sem filas intermináveis.
No fim, resta-lhe pagar duas vezes: primeiro ao Estado, depois aos privados.
Paga impostos de rico para sustentar serviços públicos que não consegue usar, e ainda financia creches, escolas, universidades e hospitais privados para suprir aquilo que devia ser garantido.
De fora, qualquer observador poderia imaginar convulsões sociais permanentes.
Mas não. Em Portugal, as pessoas reclamam pouco. E quando reclamam, raramente é à pessoa certa. Quando fazem greve é sobretudo para prolongar as pontes ou por que dá jeito a algum partido. Tudo permanece igual.
E o país vai-se habituando a viver com estas absurdidades.




