Saúde mental
Psico, terapias e as coisas terapêuticas

Se nos últimos anos notou um aumento da frequência com que ouviu: “hoje não posso, tenho psicóloga”; ou : “não preciso cá de psicólogos, correr é a minha terapia” ou ainda: “experimentei psicoterapia, mas não resultou, então agora faço Reiki”; é provável que viva num ambiente em que a literacia em saúde mental está em rápido desenvolvimento. Como em qualquer área emergente no discurso público, confusões, dúvidas e imprecisões são frequentes e expectáveis. Na posição de psicólogo, proponho-me então a esclarecer estas questões, tentando evitar alguns dos vieses corporativistas que marcam semelhantes debates.
Existe uma grande subjectividade na forma como vivemos e manifestamos a saúde mental, bem como o que nos permite melhorá-la, ou aquilo que tem um efeito terapêutico. Algo que tendemos a concordar é que a saúde mental, à semelhança de outros recursos, é melhor quando está bem e é muita, do que quando está mal ou escasseia. Algo é terapêutico se ajudar na resolução de um problema, ou se melhorar a experiência subjetiva de alguém, afetando positivamente a sua saúde mental. Sinais de sofrimento psicológico como o stresse, a ansiedade ou os sintomas depressivos, podem acumular-se ao ponto de sentirmos que é necessário pedir ajuda especializada. Isto pode ser recorrer a profissionais de saúde como os psicólogos, a serviços de bem estar ou às terapias holísticas e alternativas.
Os psicólogos são profissionais de saúde especialistas em psicologia, a ciência que estuda a mente e os comportamentos. A profissão é protegida legalmente em muitos países, incluindo Portugal. Isto significa que para utilizar o título de psicólogo é necessário obedecer a um conjunto de critérios de formação e de práticas. Um psicólogo pode oferecer apoio psicológico, que tem efeitos terapêuticos fundamentados cientificamente. Ouvimos também, por vezes, o termo psicoterapia, que apesar de muitas vezes ser usado como sinónimo de apoio psicológico apresenta algumas nuances. Psicoterapia é o apoio psicológico realizado por um psicoterapeuta. Estes são profissionais com treino aprofundado numa abordagem específica ao apoio psicológico, o que normalmente significa que têm mais formação e mais experiência do que outros psicólogos sem o mesmo grau de especialização. A maior parte das pessoas recorre à psicoterapia e ao apoio psicológico para lidar com um problema agudo no presente, mas existe também a procura com objetivos de aumentar o autoconhecimento ou de desenvolver determinadas competências pessoais.
No outro lado do campo de batalha estão as terapias holísticas. Estas, são vistas, por vezes, como estando a concorrer directamente com os serviços oferecidos pelos psicólogos, o que não pode ser posto de lado como apenas falso, mas que também não é totalmente verdadeiro. Falo do Reiki, da homeopatia, da fitoterapia, da cromoterapia, da acupuntura, e muitas outras. O meu viés enquanto psicólogo e a minha visão leiga deste tipo de terapias impossibilita-me de oferecer uma descrição que não seja puramente caricatural, pelo que não o farei. Mas, posso argumentar que, se forem bem definidos os respectivos espaços, diferentes tipos de práticas podem coexistir, já que todas podem ter, em maior ou menor grau, um efeito terapêutico. Um osteopata pode ser exímio na sua profissão, mas perante sintomas persistentes recorremos a um ortopedista. Mesmo que socialmente existam infelizes diferenças de estatuto, na prática, não é responsabilidade do osteopata operar, nem do ortopedista massajar, e ambos são necessários.
Hábitos e rotinas podem também ter o seu efeito terapêutico, como praticar exercício físico, tocar clarinete, aprender a olaria, etc. Ajudam-nos a abstrair da azáfama do dia-a-dia e talvez até nos dêem sensações positivas. Por vezes, precisamos de fazer algo diferente, cortar com a rotina, fazer algo espontâneo, mimar-nos. Pode existir um efeito terapêutico numa viagem, numas férias, num jantar com amigos, numa conversa profunda, na meditação, entre muitas outras experiências humanas.
Quer seja para melhorar a performance, lidar com a ansiedade ou fugir ao temido burnout, mesmo os mais céticos conhecem hoje a importância da saúde mental. Apesar de ser ainda a parente pobre da saúde física, é cada vez maior a oferta de serviços públicos e privados nesta área. Com tantas opções, a informação é a ferramenta principal para percebermos o que é indicado para nós, de acordo com as necessidades de cada um e de cada momento.
O autor não aderiu ao novo acordo ortográfico