Semear nuvens e colher tempestades

Habituado a longos períodos sem chuva, o emirado do Dubai deparou-se, em menos de 24 horas, com um nível de precipitação incomum, gerando-se o caos, particularmente, na pista do aeroporto e em várias artérias das cidades. Um dia bastou para que caísse mais do dobro da chuva que habitualmente cai ao longo de um ano. Em Al-Ain, por exemplo, registaram-se valores de precipitação na ordem dos 256 mm/24 horas. Um valor nunca visto que gerou algumas teorias e especulações sobre a origem de tal ocorrência.
Se por um lado há quem se refira a este evento como uma consequência directa das alterações climáticas, outros há que apontam a responsabilidade para a técnica de “semear nuvens”, muito utilizada nos Emirados Árabes Unidos. Todavia, segundo a opinião de alguns especialistas do clima, este fenómeno extremo deveu-se a uma baixa pressão, que atraiu ar quente e húmido. O ar quente terá permitido a retenção de mais humidade que, por seu lado, contribuiu para um aumento da intensidade da chuva.
Perante estas três possibilidades não será fácil quantificar o peso a atribuir a cada uma delas e só uma análise científica mais aprofundada e assente em factores humanos e naturais poderá determinar com maior exactidão o que realmente desencadeou tal fenómeno. Provavelmente, todas terão a sua quota-parte de razão e até poderá ter ocorrido a conjugação de vários factores.

Comecemos pelo impacto das alterações climáticas que, como sabemos, têm sido associadas à ocorrência de fenómenos extremos, desde as secas prolongadas até às cheias que acontecem num curto espaço de tempo. Terá sido esta ocorrência um desses fenómenos provocados pelas alterações climáticas?
E, qual a influência da “sementeira de nuvens”? A “sementeira de nuvens” é feita por aeronaves que injectam sais compostos por pequenas partículas de iodeto de prata nas nuvens. Estas actuam como um catalisador e favorecem a condensação e a ocorrência de chuva. Apesar de se tratar de um processo de elevados custos monetários, esta técnica artificial de criação de chuva existe há décadas e é utilizada com alguma frequência pelos Emirados Árabes Unidos para mitigarem o problema da escassez de água, sobretudo quando as condições de vento, umidade e poeira são insuficientes para provocarem a precipitação. Terá havido “sementeira de nuvens”?

Por fim, as razões apontadas por vários especialistas climáticos parecem fazer sentido e têm uma explicação científica, pois, fenómenos climatéricos extremos sempre ocorreram em várias regiões da Terra desde que a Humanidade existe, quando ainda não se falava em alterações climáticas e, muito menos, em “semear nuvens”. A baixa pressão apontada pelos especialistas terá desencadeado esta tempestade?
Independentemente da causa que deu origem ao evento com estas consequências devastadoras, a severidade destas inundações deveu-se, também, à forma como o Dubai está edificado, assente em deficientes sistemas de drenagem de águas pluviais e na ausência de espaços verdes para absorção dos elevados níveis de humidade. Perante estas evidências, urge uma maior preparação do emirado para estes fenómenos de pluviosidade extrema, assente em estratégias e medidas de adaptação a esta nova realidade.

O autor não aderiu ao novo acordo ortográfico

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