Ígor Lopes
Palavra ao Associado AILD
Jornalista, escritor e social media entre Brasil e Portugal. Doutorando em Ciências da Comunicação, Mestre em Comunicação e Jornalismo, Especialista em Gestão de Comunidades e Redes Sociais para Jornalistas e Licenciado em Comunicação Social. Autor de quatro livros-reportagem que conectam os dois países. CEO da Agência Incomparáveis, e correspondente da Agência e-Global.
Quando foi o seu regresso a Portugal?
Nasci e vivi no Rio de Janeiro. Por duas vezes decidi viver em Portugal. Aos 24 anos, em 2004, quando trabalhei na imprensa portuguesa. Em 2010, regressei ao Brasil para trabalhar em projetos de comunicação entre os dois países. Mais recentemente, em 2018, regressei a Portugal para mais alguns desafios pessoais e profissionais.
Motivações desse regresso?
Regressei a Portugal para procurar uma melhor qualidade de vida, neste momento. Trouxe a minha família e estamos felizes com esta nova fase nas nossas vidas. Portugal é um caminho natural de quem tem raízes fortes no país, como eu. Mas o coração está sempre dividido, em constante mutação emocional entre Brasil e Portugal.
Que projetos está a desenvolver?
Iniciei recentemente o doutoramento na Universidade da Beira Interior, na Covilhã, e comecei as entrevistas para um novo livro que irá tratar da tradicional Festa da Agonia, em Viana do Castelo, trabalho direcionado para brasileiros e lusodescendentes. A minha mudança para Portugal prende-se também, com o facto de ter sido convidado para integrar um projeto da ONU, através da UNICEF, com jovens refugiados. Em paralelo, desenvolvo trabalhos com a Agência Incomparáveis, na qual trato assuntos entre Brasil e Portugal sob uma perspetiva dinâmica, com foco em temas baseados em aspetos sociais, culturais e comerciais.
Expetativas relativas a Portugal?
Nesta nova “viagem” a Portugal, espero poder acompanhar de perto o desenvolvimento do país e trabalhar, na vertente comunicacional, para aproximar ainda mais brasileiros e portugueses. Acredito que há muito por descobrir, por desbravar. Somos países irmãos que pouco se conhecem, efetivamente. Temos relações que, por muitas vezes, são superficiais, baseadas em estereótipos, quando temos grande influência na região onde estamos inseridos, tanto na Europa como na América do Sul. E podemos tirar bons dividendos desse cenário.
Dificuldades sentidas no regresso?
Não senti grandes dificuldades por ter uma boa estrutura familiar e uma “base operacional”, casa própria, no Douro. E também, porque procuro observar os aspetos positivos em todas as situações. Porém, e por ter discernimento sobre as necessidades da comunidade portuguesa que pretende regressar a Portugal, existe uma enorme dificuldade em se obter informações sobre os programas existentes, que prometem auxílio para a mudança para Portugal, como por exemplo, para ingressar no ensino superior, para ter acesso a oportunidades profissionais e, inclusive, para iniciar uma atividade empresarial ou investir em Portugal. É necessário investir em pontos focais que auxiliam nesses aspetos. Fui procurado por pessoas que não conseguiram aceder às ajudas governamentais em virtude da burocracia, dos prazos ou da pouca informação disponível. Ou seja, apesar de existirem protocolos e projetos que prometem ajudar no regresso dessa comunidade, há dificuldades na efetivação dos mesmos. E a Covid-19 atrapalhou ainda mais.
Sugestões para que voltem mais lusodescendentes a Portugal?
A vida em Portugal tem muitos aspetos positivos. Mas é preciso ter em mente que na grande maioria das vezes toda mudança é atribulada e pode acontecer de termos as nossas expectativas defraudadas, numa fase inicial. Nem sempre a chegada e a adaptação à rotina diária no país são pacíficas. Por outro lado, quem decide viver em Portugal deve, além de procurar oportunidades profissionais, ficar atentos às possibilidades de investimentos em várias áreas. Há nichos de mercado que merecem atenção no contexto europeu, num mundo pós-Covid, como na restauração, na construção civil e no mercado digital. Portugal tem uma grande desfasagem entre empresas com presença on-line as empresas tradicionais que não querem sair da sua zona de conforto e alcançar novos públicos. Geralmente, esses gestores, mesmo que familiares, não têm conhecimento para essa aventura na Internet. Está aí uma boa oportunidade profissional. É preciso que as empresas estejam on-line.
O que mais o encanta em Portugal?
Quase tudo me encanta, mas a qualidade de vida, a gastronomia, as minhas origens e o património histórico e cultural do país têm um valor inestimável. Importa destacar que as minhas origens são em Armamar, no Douro, distrito de Viseu, por parte de mãe. E, por parte de pai, em Constantim, Trás-os-Montes, distrito de Vila Real.
O que menos o encanta em Portugal?
A burocracia. Alguns aspetos são muito burocráticos, como abertura de empresas, a questão do IVA, gestão financeira e etc. Perder tempo com soluções que poderiam ser “facilitadas” não faz sentido num contexto de desenvolvimento em que Portugal se encontra. Um país que apela a que a sua comunidade que vive no estrangeiro volte a viver em Portugal, deve apostar na centralização dos serviços, das informações, pois não se trata, na maior parte das vezes, de cidadãos puramente estrangeiros ou puramente nacionais. São um misto de “cultura pessoal”, próprio de quem vivia noutro país, mas que nutria uma aproximação a Portugal. Nem tudo precisa ser “novo”. Quem chega, e não está em contexto de reforma, e vier para trabalhar ou estudar, não precisa necessariamente “perder tempo” a procurar informações em locais e ferramentas descentralizadas, como “onde encontro uma casa para arrendar ou comprar”, “onde posso pedir um serviço internet móvel ou fixa”, “onde devo pagar os meus impostos”, entre muitas outras dúvidas que, no dia a dia, atrasam e perturbam a adaptação de quem chega. Se é burocrático para quem já vive no país, imagine para quem está a chegar com brilho nos olhos, saudades para matar e sonhos por realizar?
Uma mensagem para os outros associados?
Defendo o conceito de luso-brasilidade, que diz respeito à condição específica – cultural, social e afetiva – de quem compartilha os seus anos de vida no Brasil, em Portugal ou entre os dois países. A ligação entre essas duas nações é forte, sensorial, apolítica. Temos uma forma única de viver, de pensar, de agir. Levamos no peito sentimentos indivisíveis. Não somos de lá, nem de cá. Somos um só. Lusófonos e, sobretudo, luso-brasileiros. No âmbito da Agência Incomparáveis trabalho os temas jornalísticos entre os dois países pela componente afetiva.
Paulo Porto
4 anos agoExcelente profissional e grande conhecedor das comunidades portuguesas.