A bitcoin e os mitos
Parte II
Terceiro mito: A bitcoin é apenas um ativo de risco, usada por criminosos.
“As criptomoedas servem para um tipo especial de transações, as que procuram evitar ser rastreadas, ou seja, o crime, e para outros agentes servem como acumulação de capital. Logo, a criptomoeda não é uma moeda por não ter um uso generalizado no comércio e na vida comum”.
Francisco Louçã, “Bitcoin alta da moeda falsa”
Em primeiro lugar, desde 2010 a banca já foi multada em largos mil milhões de euros por facilitar pagamentos ilícitos o que demonstra que obviamente a bitcoin não é, nem será no futuro próximo, o mecanismo de excelência para transações ilegais. Para tal, já existe a banca tradicional.
Em segundo lugar, é verdade que a bitcoin não é ainda usada como moeda pela maioria dos “hodlers”. Este comportamento faz todo o sentido, de um ponto de vista racional, visto que o preço de cada bitcoin está, aos dias de hoje, muito desproporcional quando visto à luz de toda a moeda em circulação. Isto é, se a bitcoin fosse a moeda de excelência usada por grande parte da população mundial, o valor de cada unidade seria muito mais elevado do que é hoje.
Devido a esta óbvia assimetria, é normal que aqueles que têm bitcoin não a queiram usar para pagamentos.
Ainda.
Contudo, e isto é algo que estes colegas mais tradicionais não vos dizem, é que para eu consumir produtos tenho de gastar bitcoin. Ou seja, se eu quiser tirar partido da valorização da bitcoin terei de trocá-la por produtos. Como a bitcoin tem uma quantidade limitada, a probabilidade de eu voltar a adquirir estas moedas ao preço a que as vendi, é bastante reduzida. Ou seja, a bitcoin é uma moeda cujo valor real o mercado ainda não descobriu. Por essa razão é que muitos “bitcoiners” preferem acumular durante o período em que o mercado não valoriza a bitcoin da mesma forma que eles.
Quarto mito: Os bancos centrais e reguladores vão acabar por regular a criação e utilização de criptomoedas. No pior dos cenários, vão banir as criptomoedas.
“Regulate bitcoin and its clones as assets (crypto-assets), explain why the digital currency that the central banks already have should be accessible to the public and in what conditions and try to put a stop to all the irrationalities that surround these issues”.
Vítor Constâncio, no Twitter
Este tópico costuma ser bastante sensível para os que acreditam na regulação e no papel interventivo do Estado, porém, é bastante simples de explicar porque a bitcoin não poderá ser regulada. Pelo menos, não da mesma forma que outros ativos o são.
Em primeiro lugar, a bitcoin já é regulada. O seu código detém todos os incentivos e regras necessárias para que a rede funcione sem nenhuma autoridade central, como tem funcionado perfeitamente nos últimos 11 anos. Sabiam que a bitcoin esteve operacional durante 99.99% do tempo em que existe? É um facto que os críticos normalmente se esquecem de referir.
Em segundo lugar, ao regular o comércio de bitcoin os bancos centrais estão apenas a dificultar o acesso aos seus cidadãos e não a regular a bitcoin como apregoam.
Costumamos dizer no mundo das criptomoedas que nenhum Governo pode banir a bitcoin, apenas podem banir os seus cidadãos de transacionar na rede da bitcoin, visto que a bitcoin vai continuar a funcionar como sempre funcionou.
Vou fornecer um exemplo prático para que percebam a dificuldade de regular redes abertas. A Bittorrent é uma rede pública e descentralizada que permite a qualquer pessoa partilhar ficheiros peer-to-peer (P2P). Os governos tentaram de todas as formas banir e bloquear a sua utilização. Mesmo assim, a única razão para que o consumo de conteúdo ilegal tenha diminuído nos últimos anos advém do aparecimento de bons serviços de streaming, como a Netflix ou Spotify.
As pessoas não deixaram de ‘sacar’ músicas e filmes ilegalmente, porque era ilegal. Passaram a consumir conteúdo através destas plataformas, porque simplesmente é mais cómodo e fácil do que estar a fazer downloads.
Voltando ao mundo das “cripto”, Portugal é um excelente caso de estudo, visto que conseguiu proibir empresas de comprar e vender bitcoin sem uma licença bancária, antes sequer de existir uma directiva Europeia sobre o tema. Felicito a decisão destes génios do Banco de Portugal: vai certamente ajudar o nosso País a atrair mais talento e empresas focadas neste sector em franca expansão. Bravo.
O autor não aderiu ao novo acordo ortográfico
Pedro Febrero é fundador da Bityond, a primeira empresa a fazer uma Initial Coin Offering dentro das fronteiras nacionais
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