Grande Entrevista Paulo Cafôfo

Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas

Fotografia ©Tiago Araújo

Licenciado em História, pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Paulo Cafôfo exerceu docência em várias escolas da Região Autónoma da Madeira, a par de diversos cargos de direção nos Conselhos Executivos e Pedagógicos. Em 2013, assumiu a presidência da Câmara Municipal do Funchal, cargo que exerceu até 2019. Desde 2022, integra o XXIII Governo Constitucional de Portugal, onde assume a pasta da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas.

Nasceu na freguesia de Santa Luzia, no centro do Funchal, em 1971. Hoje é Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas do XXIII Governo Constitucional. Deixando os ofícios e posições de lado, quem é Paulo Cafôfo?

O exercício de auto-descrição nunca é fácil.
É do Padre António Vieira, a quem Fernando Pessoa denominou de Imperador da Língua Portuguesa, a ideia, que subscrevo, de que “Nós somos o que fazemos. O que não se faz não existe. Portanto, só existimos nos dias em que fazemos. Nos dias em que não fazemos apenas duramos.” Serei assim tudo aquilo que faço.
À parte do cargo que ocupo, ao qual me dedico com total empenho e motivação, sou como tantos outros concidadãos, madeirense, pai, cidadão, professor.

Seguiu as pisadas da sua mãe e licenciou-se em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, em 1995. Tornou-se professor de História e exerceu docência em várias escolas da Região Autónoma da Madeira, a par de diversos cargos de direção nos Conselhos Executivos e Pedagógicos. O que guarda ainda hoje desta passagem pelo ensino?

Ser professor é um privilégio e tenho muito orgulho na minha profissão. Tenho boas lembranças desses tempos de sala de aula, aonde voltei novamente durante um período em 2021 e 2022. Guardo na memória sobretudo um aspeto essencial que decorre dessa minha experiência: o empoderamento dos alunos por via do conhecimento. Muitos dos locais onde lecionei eram em zonas rurais e empobrecidas e era bastante encorajador e gratificante ver alunos meus a seguirem uma carreira, a evoluírem, por via do conhecimento.

Fotografia ©Tiago Araújo
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Foi presidente da Câmara Municipal do Funchal, entre 2013 e 2019. Presidente da AMRAM – Associação de Municípios da Região Autónoma da Madeira e da CMU – Confederação dos Municípios Ultraperiféricos. Foi também Deputado na Assembleia Legislativa Regional da Madeira e, em 2020, eleito presidente do PS Madeira, naquela que foi a maior votação de sempre da história do partido. Em que momento se dá esta entrada no mundo da política?

Dá-se em 2012-2013, antes de avançar com a minha candidatura para a presidência da Câmara Municipal do Funchal. Nessa altura fui convidado para integrar, como independente, uma iniciativa do PS denominada Laboratório de Ideias. Participei nas sessões realizadas na Madeira dessa iniciativa, em discussões e debates sobre as políticas de futuro para a Região e para o país. Na altura eu era professor, dirigente educativo e dirigente sindical. Entusiasmei-me com esse debate, exprimi as minhas ideias a minha visão de futuro para a Madeira e para o país. Passado uns meses fui convidado para liderar, como independente, uma coligação de partidos à conquista da Câmara Municipal do Funchal, que vinha de cerca de 37 anos de maiorias absolutas ininterruptas de um só partido. Correu bem, ganhei. Foi a primeira alternância de cor política da principal Câmara Municipal da Madeira em democracia.

Desde 2022 integra o executivo de António Costa, tendo sido a escolha do primeiro-ministro para substituir Berta Nunes na pasta da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas. O que o levou a aceitar este desafio?

Aceitei o desafio pela importância que reconheço às comunidades portuguesas e a possibilidade de contribuir para a sua permanente valorização, numa missão que se prossegue assente numa relação transversal decorrente das políticas que aqui se desenvolvem.
Como já foi referido, sou madeirense, nasci no Funchal, uma cidade pioneira no fenómeno da globalização. O Funchal foi uma das primeiras cidades que os europeus projetaram numa perspetiva Atlântica, sendo durante séculos um importante ancoradouro e local de passagem entre Europa, Américas e África. E a Madeira é historicamente uma Região com uma imensa Diáspora nas mais diferentes e longínquas geografias. Este enquadramento reforçou-me, naturalmente, a motivação para o diálogo com as nossas comunidades espalhadas pelo mundo.
Estimam-se em mais de 5 milhões os portugueses e lusodescendentes espalhados pelo mundo, havendo investigadores que apontam para um número ainda superior. Portugal tem uma diáspora extensa, mais de 1/3 da nossa população vive fora do território nacional. E são portugueses por inteiro que não devem ser esquecidos e muito menos desmerecidos. São o que podemos denominar de “ativo estratégico” determinante e relevante para a afirmação de Portugal, da cultura portuguesa e da língua portuguesa no mundo. Portugueses que, não esquecendo o seu país, optarem por seguir com ambições de vida noutras geografias. Portugueses para os quais tenho a motivação de aproximar de Portugal, a ambição de valorizar a sua importância e a certeza de que esta nossa imensa Diáspora tem um papel determinante no futuro do nosso país.

Enquanto Presidente da Câmara Municipal do Funchal, acompanhou as várias comunidades funchalenses espalhadas pelo mundo, nomeadamente com visitas à África do Sul, Venezuela, Reino Unido e Ilhas do Canal. Podemos afirmar que o cargo que hoje ocupa agora não difere muito da política que já conhece?

São formas diferentes de servir a causa pública, que têm em comum um trabalho de proximidade em prol das pessoas.
Enquanto autarca, destacando a abrangência dos dossiês, tentei sempre ter na minha agenda as comunidades madeirenses, neste caso funchalenses, como prioridade.
Como Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas o âmbito do trabalho e da intervenção é necessariamente diferente, incomparável senão na finalidade última daquela que é a ação política, servir as pessoas, desenvolver, avançar.

A melhoria da qualidade e eficiência do serviço prestado pelos consulados, o apoio social, o incentivo ao investimento, a dinamização cultural e o ensino da Língua Portuguesa foram alguns dos objetivos assumidos para este mandato. Decorrido um ano desde a tomada de posse que balanço faz?

As nossas Comunidades constituem um ativo estratégico, a nível político, económico e cultural, para o posicionamento de Portugal no mundo e o Governo continua empenhado na valorização das Comunidades Portuguesas. No dia 30 de março faz um ano que tomei posse e as prioridades neste ano têm sido em linha com esse propósito, em várias dimensões.
Na dimensão da permanente melhoria do serviço público, temos apostado em dotar os postos consulares dos meios humanos, financeiros e tecnológicos adequados às necessidades e aspirações das comunidades portuguesas e, em geral, de todos os utentes que a eles acorrem. Dando sequência a esta prioridade destaco a implementação do Novo Modelo de Gestão Consular, que alarga o espectro de soluções disponíveis para os nossos concidadãos, com a introdução de canais de atendimento à distância acessíveis a todos por via de aplicações informáticas. Constituirá, a meu ver, uma ferramenta inovadora, trazendo celeridade, eficiência e comodidade para os utentes.
Nesta dimensão destaco ainda o alargamento do âmbito territorial do Centro de Atendimento Consular para 11 países, permitindo um atendimento remoto via telefone e através de serviço de mensagens em atos que não requeiram uma presença física no posto, bem como a adoção de medidas extraordinárias no Consulado-Geral de Portugal em Londres, com o atendimento ao sábado para pedidos de cartão de cidadão e passaporte.
Está também em curso a execução do consulado virtual, um projeto exigente, complexo e importante que esperemos que a primeira fase esteja concluída em junho.
Defendo que o atendimento será sempre tanto melhor quanto maior for a valorização e reconhecimento dos recursos humanos, e nessa componente temos conseguido avanços:
Resolvemos a situação dos trabalhadores no Brasil, que se arrastava desde 2013, com uma valorização salarial de 49%. Foram publicadas duas portarias dos mecanismos de correção cambial para 2022 e os seus pagamentos regularizados;
Foram promovidas 40 mobilidades intercarreiras e abertos 10 concursos para cargos de chefe de chancelaria e contabilidade, postos de chefias intermédias fundamentais para melhorar a eficiência na gestão, a coordenação e a capacidade de resposta.
Na dimensão da cultura, destaco o trabalho feito para a plataforma Portugal Muito Maior, que se encontra numa fase de pré-lançamento, com a inscrição de mais de 400 músicos.
Destaco o apoio ao associativismo, que vê o seu orçamento reforçado para este ano de 2023 em mais 14% e que é fundamental para as áreas da cultura, social e do ensino da língua portuguesa, que as associações desenvolvem através do seu plano anual de atividades.
E no que respeita à Língua portuguesa, a rede do Ensino do Português no Estrangeiro (EPE) tem-se vindo a consolidar com o crescimento no número de professores, atingindo os 324 no ano letivo de 2022/23, mais 12 que em 2016/17, correspondendo às necessidades dos países.
Atualmente, estimam-se em 38.575 os alunos da rede oficial EPE, num aumento de 1.300 alunos em relação a 21/22. Na rede apoiada (Austrália, Canadá, EUA e Venezuela), em 2022 somámos cerca de 34.151 alunos, um aumento de perto de 3 mil alunos, tendo o principal aumento ocorrido na Venezuela. No total, a rede oficial e a rede apoiada soma perto de 72.726 alunos.
Na dimensão do incentivo ao investimento da Diáspora, realizou-se em dezembro último, em Fátima, a edição 2022 dos Encontros do Programa Nacional de Apoio ao Investimento da Diáspora (PNAID), sob o lema “Investimento da Diáspora, um investimento com marca. Estiveram reunidos mais de 750 participantes de mais de 35 países, com elevada participação de representantes do empreendedorismo e empresas da Diáspora. Já em junho, em Idanha-a-Nova, realizou-se o primeiro Fórum dos Gabinetes de Apoio aos Emigrantes e ao Investimento da Diáspora.
Sabendo que o potencial e o valor não se esgotam nos números, mas ajudando estes à caracterização, importa referir que, até agora, atribuímos 251 estatutos de investidor e lançámos programas de incentivo ao investimento e criação de emprego com discriminação positiva para a diáspora.
Fortalecemos o os mecanismos de apoio ao Investidor da Diáspora e criámos a Rede de Apoio ao Investidor da Diáspora (RAID) envolvendo mais de 300 entidades.
Foram apoiados 125 projetos pelo GAID/RAID, que correspondem a perto de 123 milhões de euros de investimento potencial em Portugal, sobretudo no interior do país.
O número de Gabinetes de Apoio aos Emigrantes duplicou em sete anos, contando-se hoje com 202.

Fotografia ©Tiago Araújo
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As Comunidades Portuguesas espalhadas pelo mundo, têm vindo a reivindicar que Portugal precisa olhar com mais atenção para os problemas que os emigrantes atravessam e que, em certos casos, esses problemas se poderiam solucionar com mais organização e empenho do Estado. Quais as principais reivindicações que chegam junto da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas no que diz respeito às dificuldades sentidas pelas comunidades portuguesas?

O Governo tem estado atento na procura de soluções que têm sido adequadas na mitigação das dificuldades que têm vindo a ser sinalizadas, indo ao encontro das necessidades das nossas comunidades. Das oportunidades de melhoria a que se tem vindo a corresponder, destaco dois pontos: o atendimento consular e o apoio social.
No que respeita ao atendimento consular, temos trabalhado em conjunto com os postos e outras áreas de ação governativa no sentido de melhorar os meios de atendimento com ganhos de eficiência, de tempo e comodidade para os nossos cidadãos, como abordei anteriormente.
No que respeita ao apoio social, temos estado atentos às dinâmicas e perfil das nossas comunidades, em particular as mais envelhecidas, em países que apresentam maiores desafios e onde, conjugando estes dois fatores, se assistem a maiores riscos de vulnerabilidade. A Venezuela é o país onde mais apoiamos as comunidades portuguesas, atenta a situação económica débil que o país atravessa. Entre 2017 e 2022, o total de despesa pública com os diferentes apoios concedidos naquele país ascendeu a 1.822.523,58 €. Também a África do Sul merece uma atenção especial nesta matéria. Aquando da minha visita à nossa comunidade naquele país, no final de 2022, lancei as bases para se efetuar um mapeamento exaustivo das carências da comunidade portuguesa na África do Sul, face à degradação das condições de vida naquele país e acelerar do envelhecimento da comunidade.

O Presidente do Conselho das Comunidades Portuguesas, Flávio Martins, afirmou em entrevista à Descendências que continua em desacordo com o Governo em relação ao ensino do português no estrangeiro. Tendo a Língua Portuguesa um papel agregador e de coesão da nossa identidade, sendo ela um fator de unidade nacional, em particular nas nossas comunidades espalhadas pelo mundo, o investimento do seu ensino no estrangeiro, em particular aos lusodescendentes não devia ser uma das principais missões do Governo e, em especial, da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, como aliás foi por si assumido no início do mandato?

O Ensino do Português no Estrangeiro é uma das nossas prioridades de atuação e o desafio passa por afirmar a Língua Portuguesa como língua de herança com futuro, como língua da cidadania, da diplomacia, da ciência, do conhecimento, da investigação e do saber, dos negócios e das artes.
O reforço da promoção da Língua e Cultura Portuguesas é, neste contexto, imprescindível, quer consolidando o trabalho de reforço estratégico e a dinâmica de alargamento da rede de ensino no estrangeiro, quer reforçando a certificação da Língua portuguesa, apostando na transição digital do EPE.
E para encarar e superar estes desafios, é essencial que o corpo de professores, leitores e todos aqueles que contribuem para o ensino da Língua estejam motivados e empenhados. Para tal estamos a desenvolver esforços pela dignificação da carreira, com medidas que focam a sua valorização, em particular com a revisão do mecanismo de correção cambial e do regime jurídico do EPE.
A Língua Portuguesa é o forte elo que une a Lusofonia, uma riqueza coletiva e individual. O investimento na Língua Portuguesa beneficia todos nós, todos os que queremos ver a importância de Portugal no mundo a crescer, com a língua e a cultura portuguesa a assumirem uma maior relevância no plano global.

Fotografia ©Tiago Araújo
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O ano passado afirmou que “os Portugueses espalhados pelo mundo não se devem sentir ‘segundos Portugueses’, não se devem sentir marginalizados ou desprezados. Dito, isto é importante dar atenção a estes portugueses, para que a distância geográfica não seja também uma distância cultural e linguística?

É importante que os portugueses se sintam portugueses por inteiro, independentemente de onde estiverem. O encurtar das distâncias com a nossa diáspora é um desiderato tão ambicioso como exigente, mas ao qual estamos empenhados em oferecer soluções. Dou um exemplo prático de uma medida concreta: a digitalização do EPE. Na prática, trata-se de chegar a alunos em que não é possível considerar o ensino presencial atenta a dispersão geográfica e o número reduzido de alunos. Por via da digitalização, será possível assegurar que os alunos portugueses e lusodescendente têm acesso à aprendizagem do português e da cultura portuguesa. Trata-se de um investimento de cerca de 17 milhões de euros.

De que forma a Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas tem procurado dar mais “voz” às comunidades portuguesas?

Tenho procurado estar próximo das nossas comunidades o máximo quanto possível, presencialmente. Desenvolvemos o Roteiro Portugal no Mundo, Caminho para a Valorização das Comunidades Portuguesas, que enquadra a realização de visitas aos países da nossa Diáspora, colocando em evidência uma série de áreas que permitem reconhecer a importância dos portugueses na afirmação do nosso país no mundo, aproximando os portugueses residentes no estrangeiro do nosso país e, simultaneamente, contribuir para uma visão moderna da nossa diáspora, valorizando o seu papel na dimensão que dão a Portugal.
Este roteiro agrega oito áreas em que os portugueses no mundo se destacam, e onde se salientam as políticas para as comunidades portuguesas: a Cidadania ativa, Inclusão e igualdade, Empreendedorismo e inovação, Educação e Língua Portuguesa, Juventude e talento, Ciência e tecnologia, Cultura e criatividade e Modernização do Estado.
No âmbito desta iniciativa já estive com as nossas comunidades em nove países: França, Reino Unido, Andorra, Suíça, Venezuela, Angola, EUA, África do Sul e Brasil.

As dificuldades acrescidas ao nível do funcionamento dos postos consulares, agravadas pela pandemia, foi outro dos pontos abordados por Flávio Martins, Presidente do Conselho das Comunidades Portuguesas. A abertura de 10 concursos para cargos de chefe de chancelaria e contabilidade e a possível contratação de até 133 funcionários são algumas das medidas já desenvolvidas com o objetivo de solucionar esta precariedade da rede consular?

O reforço dos recursos humanos nos postos consulares, a sua valorização, bem assim como a melhoria das condições materiais e tecnológicas continuarão a balizar a nossa ação. E a adequação dos meios humanos às necessidades das nossas comunidades constitui o eixo central. Como referi anteriormente, entrarão em funções muito em breve 10 Chefes de Chancelaria e Contabilidade, cargos de chefia intermédia, contribuindo de forma relevante para aumentar a capacidade de resposta, mas também a gestão. Dando também seguimento à política deste Governo desde 2015, iremos brevemente avançar com a contratação de mais trabalhadores, esperando que, de forma expedita, mas sempre norteados pela sua qualidade, até 133 trabalhadores venham a reforçar a nossa rede externa. Temos claras as necessidades da Rede e os meios necessários para a reforçar, pelo que estas, e outras medidas, serão progressivamente implementadas em benefício de todos aqueles que delas necessitem.

Que outras medidas estão previstas para a rede consular e que se traduzirão numa melhoria dos serviços prestados aos cidadãos?

Permita-me, em primeiro lugar, que possa deixar expresso um agradecimento, louvando a dedicação à causa pública, o trabalho e o elevado profissionalismo dos nossos trabalhadores – diplomáticos e consulares – que procuram, todos os dias, promover o nosso país, a nossa economia e a nossa cultura, prestando um serviço público de qualidade.
Correspondendo a esta permanente disponibilidade, temos presente que a valorização dos nossos colaboradores é justa e necessária. No concreto, temos vindo a promover, progressivamente, um conjunto de mobilidades intercarreiras de trabalhadores dos Serviços Periféricos Externos, que se traduz numa alteração da sua carreira de origem para outra de grau de complexidade superior com uma valorização remuneratória associada. Paralelamente, e reconhecendo que as condições de vida nos países onde estamos presentes são distintas e sujeitas a alterações, que não encontram coincidência com as verificadas em Portugal, estamos empenhados em rever as condições remuneratórias aplicadas localmente. Neste processo temos vindo a manter contacto regular com os representantes destes nossos trabalhadores com o intuito de rever as tabelas remuneratórias atualmente em vigor.
Tal como antes referi, adicionalmente, em dezembro, e tendo em consideração a erosão salarial dos nossos trabalhadores no Brasil, foi publicada a portaria que procedeu à alteração dos valores da remuneração base dos trabalhadores dos Serviços Periféricos Externos nesse país, consubstanciando um aumento de 49%, com efeito retroativo a janeiro de 2022.
Estas medidas cumprem um objetivo que muito valorizamos. Reconhecer o excelente trabalho dos nossos colaboradores, criando melhores condições ao nível dos meios, mas também, porque se reveste de inteira justiça, de remuneração. Pretendemos promover as melhores condições para que se sintam reconhecidos e continuem na casa, mas também assegurar as condições para a contratação de trabalhadores com qualificações alargadas.

O voto eletrónico para as comunidades portuguesas era uma matéria aparentemente de consenso alargado entre os partidos e que criava entusiasmo nos eleitores portugueses residente no estrangeiro. Muito recentemente tomamos conhecimento que o PS deixou cair o voto eletrónico e a merecer fortes críticas por parte do PSD. O que mudou afinal, para esta nova posição por parte do PS?

Este é um assunto que diz respeito à Assembleia da República e aos senhores deputados.

Fotografia ©Tiago Araújo
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Ao longo das décadas foram sendo registados picos migratórios, como o ocorrido entre 1969 e 1973. A procura por melhores condições de vida levava milhares de pessoas a encontrar no estrangeiro a única solução de futuro. Contudo, a emigração, como a víamos há 20 anos, mudou radicalmente. A nova emigração é abundante, variada e com percursos diversos. Estas alterações fazem com que a Secretaria de Estado tenha que enfrentar novos desafios?

O fenómeno da emigração tem tido mudanças e evoluções interessantes, nos destinos e no próprio perfil do emigrante.
A emigração portuguesa concentra-se sobretudo na Europa, cifrando-se anualmente em valores distantes de outros tempos. Cerca de 60 mil portugueses emigraram em 2021. Temos de recuar a 2003 para encontrar igual valor. Nas décadas de 60/70 a emigração portuguesa foi alarmante, causando a desertificação do interior do país, o envelhecimento da população e quebra económica. Foi um Portugal que nos deixou.
O paradigma da emigração mudou, sendo importante ter em atenção os países onde permanecem comunidades portuguesas extensas, mas onde decaíram os fluxos migratórios, com o reforçar das políticas para manter as futuras gerações conectadas com Portugal e o enraizamento cultural, bem como com medidas para mitigar o envelhecimento acentuado dessas comunidades. Muitas delas atravessam fragilidades e necessitam de apoio do Estado Português.
A nova geração de emigrantes coloca desafios desde logo na reinvenção da manutenção da proximidade com os serviços do Estado Português através de ferramentas online adequadas, eficientes e que deem resposta num contexto imediato.
Nunca como hoje foi tão importante dar atenção a estas portuguesas e a estes portugueses encurtando a distância geográfica através da proximidade cultural e linguística. A promoção da língua, do associativismo e da comunicação social lusófona são apostas de todos os dias para o caminho que se quer trilhar.

As comunidades portuguesas no mundo são um dos mais importantes ativos estratégicos da política externa do Estado português e são a mais forte manifestação do Portugal global. Constituem a porta de entrada de Portugal no mundo globalizado e, simultaneamente, a introdução do mundo nos territórios locais e regionais. De que forma o trabalho desenvolvido por entidades e associações como é exemplo a Associação Internacional dos Lusodescendentes e a revista Descendências Magazine, que têm contacto privilegiado com um público abrangente, nomeadamente com as comunidades portuguesas, tem sido fundamental?

O papel do movimento associativo é fundamental. Como referem, as comunidades portuguesas são uma forte manifestação do Portugal global. O trabalho que o movimento associativo desenvolve nas mais diversas áreas, contribui para a manutenção dos laços da comunidade à portugalidade, seja através da cultura, da língua portuguesa, assim como nas atividades na área social, funcionando a solidariedade entre a comunidade como um elemento agregador. Os tempos que correm são um verdadeiro desafio para muitas das associações, sendo por isso fundamental continuar a acarinhá-las e apoiá-las, de modo que se possam modernizar e desenvolver a capacidade de atrair os mais jovens, que garantam a sua continuidade e assim a divulgação da nossa cultura e língua. Este ano foram atribuídos apoios a 107 projetos de associações da nossa diáspora, num valor total de 788.726,27 €. Mas queremos apoiar mais, há mais 14% de verba disponível para apoios, num valor que ascende a 900.000 euros.
Importa ainda referir que está a ser também preparada uma proposta de alteração ao decreto-lei dos apoios ao associativismo, com alterações que visam agilizar os processos de candidatura, simplificando-os.

Que conclusões e dividendos políticos a favor de Portugal e das Comunidades Portuguesas retira do último Encontro PNAID que decorreu recentemente em Fátima? Estes encontros continuam a ser uma aposta ganha e a valer a pena investir?

Faço um balanço muito positivo desta iniciativa. Os Encontros do Programa Nacional de Apoio ao Investimento da Diáspora (PNAID), que decorreram de 15 a 17 de dezembro em Fátima, agregaram, durante esses dias, as comunidades empreendedoras da nossa diáspora, em partilha próxima com empreendedores locais, associações empresariais, autarquias e muitos membros do governo.
Tratou-se de uma iniciativa de dimensão considerável. Por ali passaram 151 intervenientes ativos, oradores. E um conjunto de dinâmicas diversificadas e multidisciplinares que abrangem as várias facetas do investimento e do empreendedorismo. Durante os ENCONTROS PNAID 2022, Fátima foi, sem dúvida, o centro do empreendedorismo da Diáspora.
Firmou-se como uma ocasião para a criação de oportunidades de negócio, para o networking, para contactos, bem como para conhecer aquilo que o país tem para oferecer numa grande montra alargada direcionada para a atração de investimento. Através da apresentação de projetos, de apoios, de oportunidades, concursos de ideias e vários outros momentos foi possível observar com substância a relevância e a pertinência do PNAID. Com mais de 750 participantes, estivemos perante um dos maiores encontros de empresários da diáspora em Portugal
O PNAID congrega quinze áreas governativas sobre o desígnio comum de atrair investimento da diáspora e fazer das nossas comunidades um fator de promoção e afirmação de Portugal, apoiando as exportações e a internacionalização das empresas, enquanto contribuímos para a coesão territorial e fixação de pessoas e negócios nos territórios do interior. Este programa governamental já se encontra em grau elevado de execução e os resultados alcançados até agora, evidenciam a sua importância estratégica para o país.
Os ENCONTROS PNAID são uma peça central neste programa e, como ficou bem demonstrado em Fátima, esta é uma aposta de futuro e na qual iremos continuar a investir.

Estima-se que vivam hoje no globo mais de 2 milhões de emigrantes portugueses, sendo que, se contarmos com os lusodescendentes, a população de origem portuguesa nos países de emigração rondará os 5 milhões – mais de 40% da população residente em território nacional. Que mensagem gostaria de deixar a todos os nossos leitores, em especial, aos milhões de portugueses espalhados pelo mundo que encontraram noutro país uma nova janela de oportunidades?

Gostaria de aproveitar esta oportunidade para dizer às portuguesas e aos portugueses que compõem as nossas comunidades que Portugal é e sempre será o seu país. A nossa diáspora é uma extensão viva do que somos coletivamente, a nossa diáspora é Portugal. Sempre fomos um país que abraça o mundo de forma audaciosa, feito de pessoas corajosas que não tiveram medo de se colocarem em barcaças, num mar imprevisível, para se fazerem ao desconhecido. Da mesma forma, muitos dos nossos conterrâneos embarcaram na aventura da descoberta de outros países, em busca de outras oportunidades. Tenho por todas e por todos muito respeito e muito orgulho.

Fotografia ©Tiago Araújo

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