Elizabeth Casqueiro

Elizabeth Casqueiro é uma artista plástica fascinada pela interação complexa entre a natureza e o ambiente construído, e pelos significados inerentes nesta conexão. A sua obra artística explora, através de uma definição expansiva da pintura, as formas em que estes dois meios se cruzam, moldando os lugares que habitamos, as experiências que neles temos e as pessoas que nos tornamos.
Influenciada pelo seu passado em arquitetura, a sua herança portuguesa, e as memórias de uma infância rodeada de flores e padrões, ela usa a linguagem da cor, dos materiais e do simbolismo para refletir sobre a experiência humana.
Com exposições coletivas e individuais nos Estados Unidos e na Europa, recebeu numerosos prémios, entre outros, a Bienal de Londres, a DC Arts and Humanities, e a Maryland State Arts Council.

Nasceu no Reino Unido, com 1 ano de idade foi para Portugal, era para ter sido economista, pela vontade do seu pai, (que não era a sua), acabou por se matricular em arquitetura, mas acabou por causa da agitação de 1974 por viajar para os Estados Unidos, para ver se a situação acalmava, mas acabou por ficar. Como foi essa nova vida sozinha, num novo país?

Quando saí de Portugal sozinha aos 23 anos para explorar oportunidades nos Estados Unidos, foi com um sentimento de pena de deixar para trás família, amigos, e país. Mas em Portugal nessa altura não havia oportunidade de continuar com os meus estudos em arquitetura, visto a faculdade ter fechado com a agitação do 25 de Abril, e o setor de trabalho estava muito difícil. Por isso lancei-me num futuro incerto, mas prometedor, com o âmbito de voltar em breve com os estudos acabados.
Vim a descobrir um mundo aberto, carinhoso, convidativo, e pronto a dar uma mão a uma jovem estrangeira motivada e disposta a trabalhar. Nunca me esquecerei das pessoas que me ajudaram nesses primeiros anos, como a família americana com quem tinha vivido aos 18 anos como bolseira do American Field Service que me deu guarida e apoio, o gerente do FMI que me ofereceu uma posição administrativa com visto diplomático, o arquiteto que me deu o primeiro emprego part-time em arquitetura e obteve o meu visto permanente de trabalho (“green card”), o reitor da Universidade Católica que me aceitou no programa de Mestrado de Arquitetura sem eu ter cumprido todos os requisitos, e tantos outros.
Embora as saudades fossem muitas nesses primeiros anos, nunca mais voltei a viver em Portugal, porque a vida tinha outros planos para mim.

Trabalhou durante muitos anos em arquitetura em diferentes países. Como foi essa experiência profissional?

Tive a sorte de viver em três cidades (Lisboa, Washington, e Londres) e trabalhar em projetos em mais de 50 países. Desenvolvi uma flexibilidade na forma de trabalhar, uma capacidade de adaptação a culturas diferentes, e uma apreciação pelas tradições estéticas e urbanas de cada país. Reconheci que o espírito e o trajeto humano se descobre através das artes e da arquitetura que deixamos para trás. Mas mais importante, aprendi que somos uma comunidade global com as mesmas emoções e preocupações básicas, e que a nossa sobrevivência como espécie humana depende da nossa capacidade de união, de elevarmos uns aos outros, e de reconhecermos a beleza que existe em cada um de nós.

Qual é a sua maior paixão? A arquitetura ou a pintura? Há pontos comuns, para além do desenho e da criatividade?

Adoro arquitetura e tenho muito orgulho em ter praticado a profissão. Mas, na verdade, a minha paixão maior sempre foi o ramo das artes. Se me perguntarem por que eu diria que as artes, especificamente as artes plásticas, oferecem uma liberdade de expressão e um resultado imediato que não existe em arquitetura. Em termos de pontos comuns (para além do desenho e da criatividade), tanto a arquitetura como as artes plásticas requerem uma audiência para a sua realização. Ambas práticas abrem portas para novas experiências e formas de ver. Nas duas instâncias, existem relações com matemática, poesia, e música.

Sempre desenhou e pintou ao longo da sua vida e já tinha como objetivo dedicar-se a tempo inteiro às artes plásticas. O que sentiu nos primeiros dias em que estava finalmente livre para pintar?

Quando me reformei do Banco Mundial, resolvi dedicar-me a tempo inteiro às artes. Nesses primeiros dias, foi uma sensação de alívio que agora tinha o tempo e os recursos para realizar este sonho. No entanto, logo vim a perceber que estava a embarcar numa nova carreira, e que teria de trabalhar muito e estudar ainda mais se quisesse saltar do passatempo à prática profissional. Decidi tomar o desafio a sério.

Quais foram as suas maiores influências nas artes?

Alguns pintores que mais me influenciaram são Henri Matisse, Willem de Kooning, Georges Braque, Robert Rauschenberg, Júlio Pomar, R. B. Kitaj, Helen Frankenthaler, e Julie Mehretu. As artes urbanas, como o graffiti, também me inspiram em termos do impacto visual, da emotividade e da natureza gestual.

Sabemos que trouxe da arquitetura o foco e a organização. Como é o seu processo de pintura?

O meu processo de pintura é bastante intuitivo. Não planeio muito o que vou fazer. Muitas vezes começo passando tinta colorida muito aguada sobre a tela, sem nenhuma ideia em mente. As formas produzidas dão-me pistas para o que se segue. E assim inicia-se um diálogo entre mim e quadro, uma conversa constante que muda de rumo com cada pincelada. O trabalho final é sempre uma surpresa.

Há mais oportunidades para os artistas plásticos nos Estados Unidos em relação a Portugal? É mais fácil o seu sucesso?

Em termos de oportunidade para exposições, penso que existem mais oportunidade nos Estados Unidos para os artistas concorrerem a chamadas, concursos e bolsas. Há também o mundo das galerias, mas o número e qualidade depende das cidades. Por exemplo, em Nova Iorque existem imensas galerias ótimas, mas a competição para entrar é também imensa. Em Washington DC existem poucas galerias, e nenhuma delas é de primeira categoria.
Mas em termos de mercado de compra, realmente não sei onde há mais procura. Nos Estados Unidos passámos uma fase em que havia muitos colecionadores dispostos a pagar por arte original. Atualmente, as pessoas preferem gastar dinheiro noutras coisas. Além disso, os colecionadores mais sérios costumam comprar diretamente dos centros de arte conhecidos (Nova Iorque, Londres, Berlim), em vez dos mercados secundários.

Está nos seus planos o regresso a Portugal?

Penso que já não regressarei permanentemente a Portugal. Tenho filhos e netos espalhados pelos Estados Unidos e o meu marido é americano. Mas tenho casa em Portugal onde passo tempo todos os anos, gozando da companhia dos meus irmãos e amigos de liceu, matando saudades e desfrutando das muitas qualidades que o nosso país oferece.

Pode-nos revelar alguns dos projetos para 2025?

Este ano de 2025 tem sido, e vai continuar a ser, bastante ativo para mim. No total terei pelo menos três exposições em Washington e em Maryland, duas delas individuais. Uma das exposições individuais será um desvio para mim, pois consiste em painéis múltiplos de pano solto de grande dimensão, pintados dos dois lados, que fazem alusão à polarização sociopolítica que existe hoje nos Estados Unidos.

Uma mensagem para todos os artistas do mundo.

Ser artista é uma forma especial de ver o mundo e de sentir. Ser artista é ter o dom e o privilégio de elevar o nosso mundo através da beleza, da emoção e do significado do nosso trabalho. Ser artista é reconhecer e dar asas a este espírito criativo com que nascemos.


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